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Adriano Alves-Marreiros

Lei 13.491/2017, o júri que não há mais e o que não haverá: uma análise sobre a mudança da natureza

Promotor de Justiça Militar, Especialista em Direito Penal Militar e Processo Penal Militar e um dos autores da obra Direito Penal Militar - Teoria Crítica & Prática



1. Introdução


E foi dada a sanção presidencial à nova lei, quase na madrugada de 14 para15 de outubro de 2017, como a tarde que cai feito um viaduto da bela canção de João Bosco (1). Repentina, quando menos era esperada e que me surpreendeu entregue ao sono. Era palestrante na tarde seguinte, meu tema envolvia o conceito de crime militar e, minutos antes do almoço, que antecedia minha palestra, Samuel me envia a terrível mensagem: a mudança me alcançara dormindo e minha apresentação já estava ultrapassada: Dormientibus non succurit jus. A estranha necessidade de dormir me traíra, impedindo que eu pudesse dar a mais atualizada opinião para uma plateia cheia de estudantes: restou-me reconhecer meu erro – em dormir – citando, em português, o brocardo, já que nem o latim me vinha. Seria o bloqueio próprio dos sustos? É, gente, o direito não socorre quem dorme, confessei abestalhado e decepcionado comigo mesmo, citando agora o Raul (2).


Após uma semana de reflexões sobre a nova Lei e de ver que as coisas não permitiam conclusões tão simples e óbvias como propunham alguns – que falavam como se tivessem se livrado das correntes e visto a verdadeira da luz da qual só conhecíamos as sombras – achei que nada era tão fácil, como nunca fora em matéria de Direito Militar: teríamos muitas polêmicas e interpretações das mais sensatas às mais estapafúrdias, incluindo aquelas sempre voltadas a conseguir um jeito de facilitar a vida de quem cometeu crime e que olvidam costumeiramente a as vítimas e a Hierarquia e a disciplina, enfim, olvidam a Sociedade..


Optei, então, movido pela ideia de fatiamento que tanto se discutiu no Mensalão (3), e pelo lisonjeiro convite do meu amigo e mestre do Direito Penal, Rogério Sanchez, em escrever, primeiramente, um texto abrangendo apenas os novos parágrafos do artigo 9. Essa é a proposta deste primeiro artigo. Mas já adianto: a sanção foi uma surpresa, sim, mas não é uma tragédia como pretendem alguns.


2. O Júri que deixou de haver: Lei 9.299 não estabeleceu júri nas justiças militares.


Parece-nos que a chave desta questão causada pela recente mudança da lei passa, necessariamente, pela Lei 9299/96. Sem compreendermos o que foi feito e mantido lá atrás, não há como bem interpretar o texto atual


Na obra Direito Penal Militar - Teoria Crítica & Prática (4), foi analisada a redação de 1996 e de 2011 do mencionado Parágrafo Único do artigo 9o do CPM. Tratemos primeiro da redação original:


Parágrafo único. Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos contra civil, serão da competência da justiça comum. (Parágrafo incluído pela Lei nº 9.299, de 8.8.1996)


Vejamos, inicialmente, sobre o que dissemos acerca do contexto que acabou gerando essa primeira redação:


1996. Diversos acontecimentos com atuações polêmicas de policiais militares – em especial o chamado “Massacre de Eldorado dos Carajás”– geram questionamentos no seio da sociedade e, com o destaque dado pela imprensa, nasce o interesse de se modificar a lei, para que os policiais militares, quando acusados de crimes dolosos contra a vida de civis, em situações em que, até então, eram consideradas crimes militares, respondessem, perante a Justiça Comum – leia-se Tribunal do Júri – a fim de que um suposto corporativismo não viesse a gerar a impunidade. E qual é o diploma legal usado pelas Justiças Militares Estaduais para a apreciação e julgamento dos crimes militares cometidos por policiais militares? O Código Penal Militar (CPM). É partindo deste pressuposto, que surge a Lei 9.299, de 07.08.1996.

Usa-se, conforme foi dito, o Código Penal Militar no caso dos crimes militares cometidos pelos integrantes das polícias militares estaduais. Na verdade, porém, não é esse o seu objetivo primeiro. Ele foi elaborado para ser aplicado aos militares das Forças Armadas, sendo, porém, em razão das semelhanças de particularidades de hierarquia, disciplina e rotina castrense, aplicado, também, aos corpos de bombeiros militares e às polícias militares estaduais.

Mas o legislador, diante da opinião pública (ou, pelo menos, a da imprensa), pretendeu solucionar o problema atribuindo competência à Justiça Comum em tais casos. Para isso, decidiu fazer modificações em artigos do Código Penal Militar. Trataremos, apenas, de uma delas. O art. 9.º do CPM é o que define o que são crimes militares em tempo de paz. Com a nova redação, dada pela Lei 9.299, foi-lhe acrescentado um parágrafo único:


Também o assassinato dos menores da Candelária e CPI foram determinantes.


Os amigos Desembargador Fernando Galvão e o advogado José Osmar Coelho, Presidente do Instituto Baiano de Direito Militar, dentre outros, escreveram defendendo, antes da nova Lei, o Júri na Justiça Militar estadual.


Osmar (5) entendia que que desde a Lei 9299/96 o parágrafo único do artigo 9º do CPM era inconstitucional por fixar competência em sentido contrário à constituição, adotando uma interpretação literal. Cita o douto colega Coimbra neves que junto com Marcelo Streifinger conclui que, na esfera estadual o crime doloso contra a vida de civil continuaria sendo crime militar mas tendo a competência para julgamento dada ao Tribunal do Júri. Osmar lembra, ainda que 14 dias após a aprovação da Lei 9.299/96 surgiu o PL 2314/96 que visava, segundo sua exposição de motivos, a corrigir supostos “defeitos evidentes” da Lei e, baseado na literalidade pura, afirma que contém vício insanável. O autor afirma, ainda que muitos viram a Emenda Constitucional 45 como saneadora do suposto equívoco contido na Lei 9.299/96. Entende que esses estão errados e que o parágrafo único continuaria inconstitucional e que o crime doloso contra a vida continuaria a ser militar, não devendo ser julgado pela justiça comum vez que o juiz sumariante não se confunde com o júri, que tem assento na Constituição entre os direitos e garantias individuais e que, em resumo, o que a Emenda teria feito seria estabelecer o júri nas justiças militares estaduais. Conclui no sentido de o Congresso solucionar a questão colocando no CPPM um capítulo sobre Júri na Justiça militar estadual ou que as auditorias estaduais aplicassem as normas do CPP com base no artigo 3º, a do CPPM, questionado, ainda o CPPM.


Fernando Galvão (6) se pronuncia também no sentido da literalidade que resultaria em concluir pela inconstitucionalidade do parágrafo único acrescentado pela Lei 9.299/96. Cita o mesmo projeto mencionado por Osmar: o PL 2.314/96. Opina no sentido de que a EC 45 teria tornado o Juiz de Direito do Juízo Militar o único competente para o julgamento dos crimes militares cometidos contra civis, monocraticamente, ressalvando apenas, segundo o autor para preservar a instituição do Júri, os crimes dolosos contra avida onde o juiz singular apenas presidiria o Tribunal do Júri. Com isso, os crimes dolosos contra a vida continuariam crimes militares.


Por mais simpática que seja a tese, por mais me agrade consagrar o Tribunal da Sociedade, o órgão judicial com legitimidade plena, para crimes militares, infelizmente não há como concluir nesse sentido em nosso ordenamento jurídico.


Vejamos um pouco da tramitação da Lei 9.299/96 antes de falarmos sobre constitucionalidade.


2.1 Análise resumida do processo legislativo que levou à Lei 9.299/96, EC 45 e Lei 12.432/2011


Se formos à documentação do Congresso Nacional, veremos inicialmente que a proposta era transferir para a Justiça comum:



Em termos de tramitação, esse documento já mostra que jamais houve uma intenção de fazer júri na Justiça Militar. Parece que a intenção era clara não só de afastar o escabinado, mas também a segunda instância, os Tribunais de Justiça Militar existentes em Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul (e cuja criação de outros é constitucionalmente permitida no artigo 125, §3º ).(7)


Mas como o processo legislativo é capaz de muitas reviravoltas, busquemos um pouco mais do que ocorreu antes de chegarmos a uma conclusão. O PL 2.801 (8) de 1992, oriundo da Comissão Parlamentar de Inquérito que Investiga o Extermínio de Crianças e Adolescentes tinha a ementa “Altera o Código Penal Militar e o Código de Processo Penal Militar, remetendo à Justiça Comum o julgamento, em tempo de paz, de crimes cometidos contra civil.” Isso consta da remessa às comissões de Defesa Nacional e de Constituição e Justiça e de redação. Ratifica o que dissemos acima.


Ainda com a mesma ementa, vemos as redações a seguir, datada de 20 de fevereiro de 1992, isto é, a data do fim da CPI:



Por aí já se nota que foi cogitada a natureza comum de qualquer crime, e não só os dolosos contra a vida, praticados por qualquer agente contra civil. A redação que se pretendia para o art. 82 do CPPM já confirma uma intenção de se tirar crimes das justiças militares e não de fazer júri nas próprias justiças militares. A justificativa para essa redação era no sentido de que os trabalhos realizados pela CPI citada teriam constatado que o julgamento de policiais militares envolvidos com extermínio seriam “permeados pelo corporativismo, que gera verdadeiro sentimento de impunidade nos criminosos fardados”.


Mais tarde, com data de 24 de novembro de 1992, vemos parecer do Deputado João Fagundes em que este questiona aquela última redação que citamos. Ele afirma que o PL 3.321 de 1992, apensado ao PL 2.801 também objetivava alteração no artigo 9o do CPM, este para firmar que “Os Oficiais e Praças das Polícias Militares dos estados no exercício de funções de policiamento não são considerados militares para fins penais, sendo competente a Justiça comum para processar e julgar os crimes cometidos por ou contra eles”.


Essa interpretação duvidosa diante da redação original da Constituição que fala em “servidores militares dos estados” e ainda mais duvidosa após a Emenda Constitucional 45 que fala em “militares dos estados” ainda existe da parte de alguns juízos e tribunais, mas note-se que ela foi rejeitada na tramitação da mudança no CPM.


Prosseguindo com o voto do deputado João Fagundes, este se posiciona pela necessidade de correção, vez que a natureza militar do delito não poderia ser aferida pela condição pessoal de a vítima ser ou não ser civil. Afirma que o substitutivo apresentado retiraria a amplitude alcançada pelo projeto 2.801 deixando a competência da Justiça Militar incólume quanto aos crimes tipicamente militares que ele afirma (aparentemente considerando numeros clausus) os artigos 149 a 176, 187 a 204 e 298 do CPM. E que o art. 82 do CPPM também ficaria alterado no sentido de definir a competência da Justiça Militar estadual no tocante ao processo e julgamento de oficiais e praças das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros.


Afirma, ainda, que o PL iria contrariar o espírito do CPM já que este não protegeria a pessoa do militar mas a função por ele exercida e os bens jurídicos ligados à razão de ser das Forças Armadas e que não seria por outra razão que os civis estariam sujeitos à jurisdição militar quando praticam crimes contra as instituições Militares.(9) Nega que a Justiça Militar seja corporativista, afirmando que ela seria caracterizada como especial por princípios próprios, peculiaridades e valorização dos bens jurídicos que a sustentam, como seriam a Eleitoral e do Trabalho, não se traduzindo essa especificidade em impunidade e que haveria até um maior rigor na aplicação da Lei.


Conclui contrariamente aos dois projetos citados, apresentando substitutivo:




Com esse substitutivo, também rejeitado, fica claro que se afastou a hipótese de a redação atingir apenas policiais militares, restringindo a competência das Justiças Militares estaduais (e da distrital) aos crimes elencados no substitutivo (que o autor chama de tipicamente militares). A justificativa deixa claro que os demais crimes de militares estaduais seriam de competência da justiça comum estadual.


Após isso houve emenda substitutiva no sentido de as alíneas “a”, “b” e “c” do inciso II do art. 9º do CPM deixarem de ter a expressão “ou civil”. Isso também foi rejeitado.


Uma subemenda substitutiva estabelecia uma ressalva mudando o próprio caput do art. 9º cuja redação seria: “Excetuados os delitos dolosos contra a vida, consideram-se crimes militares em tempo de paz:”. Já o artigo 82 do CPPM teria seu caput alterado para “O Foro Militar é especial, e, exceto nos crimes dolosos contra a vida, a ele estão sujeitos, em tempo de paz:”


Nota-se que não diferenciava militares estaduais e federais como a redação dada pela Lei 9.299/96. Era uma redação que atenderia melhor a excluir os crimes dolosos contra a vida dos crimes militares, Mas o processo legislativo tem muitas idas, vindas, atecnias, etc, e nem sempre se chega ao melhor resultado. Prossigamos com mais alguns passos da tramitação.


Outra emenda substitutiva propunha um parágrafo único para o art. 82 do CPPM que disporia que “Não está sujeito ao foro militar, em tempo de paz, o julgamento de crimes praticados por qualquer agente contra civil”.


Uma redação como essa colocada na lei adjetiva, no Código de PROCESSO Penal Militar e versando sobre competência em sentido contrário à constituição não permitiria a interpretação conforme de que falaremos mais tarde. Era uma proposta extremamente infeliz e absolutamente inconstitucional.


Enfim, essa pequena análise do processo legislativo nos leva a confirmar, dentre outras coisas que:

  1. se pretendia tirar os crimes dolosos contra a vida das justiças militares: e não fazer júri nas justiças militares,

  2. que foram afastadas as hipóteses que só atingiam militares estaduais e as Justiças Militares estaduais

  3. que na vigência da atual constituição foram analisadas, pelo congresso, diversas restrições ao artigo 9o mas elas não vingaram

  4. que a tese de que a EC 45 reconheceu que a aplicação do parágrafo único do art. 9 era apenas aos militares estaduais não se sustenta, em razão do que dissemos n. 2).

Exposições de motivo servem de guia para compreensão, e é preciso lembrar que muitas mudanças são feitas no decorrer do processo legislativo. Para bem ilustrar essa questão basta lembrar o que dizia a exposição de motivos da Emenda Constitucional 45 e que não vingou:


De notar-se que perde sentido, nesse sistema, a chamada Justiça Militar, a qual deverá ater-se aos problemas da disciplina interna dos quartéis.(10)


As Justiças Militares permaneceram, apesar da intenção inicial dos proponentes


Sobre a Emenda amos nos alongar: não há qualquer indício em sua tramitação que se tenha pretendido criar um Tribunal do júri na Justiça Militar. Trataremos de sua interpretação mais adiante


Evidentemente, tratamos de forma resumida do processo legislativo, apenas com os principais aspectos da tramitação. Falemos rapidamente sobre a mudança do texto ocorrida em 2011, no contexto da Lei do abate:


Parágrafo único. Os crimes de que trata este artigo quando dolosos contra a vida e cometidos contra civil serão da competência da justiça comum, salvo quando praticados no contexto de ação militar realizada na forma do art. 303 da Lei no 7.565, de 19 de dezembro de 1986 – Código Brasileiro de Aeronáutica. (Redação dada pela Lei nº 12.432, de 2011)


Vejam que, neste caso, pouco há que se dizer: o texto permaneceu o mesmo apenas com acréscimo da ressalva quanto ao abate de aeronaves. Não há que se falar em inovação que justificasse o tribunal do júri na Justiça Militar, por mais que me agrade a ideia do Tribunal do Povo; muito pelo contrário, a mudança mostra o oposto, a preocupação do legislador em que os pilotos que tivesses que abater aeronaves fossem julgados por um conselho que não fosse leigo em assuntos militares. Isso fica ainda mais claro quando se vê que o texto original do PL 6615/09 que lhe deu origem, diz o seguinte:


Sob a regulamentação do decreto n. 5144, de 16 de julho de 2004, portanto, a Força Aérea Brasileira pode tomar medidas que conduzam mesmo ao abate da aeronave, resultando, muito provavelmente, na morte de seus ocupantes. Ora, nos termos da legislação vigente, o piloto estaria cometendo crime doloso contra a vida, devendo ser levado, por conseguinte, ao Tribunal do Júri.

(...) Não obstante, parece-nos evidente que a conduta do militar que cumpre ordens e derruba aeronave hostil não pode ser equiparada ao comportamento de alguém que cometa um homicídio comum, sujeitando-se ao Tribunal do Júri. Entendemos que cabe à Justiça castrense aquela conduta, dadas as particularidades e o contexto da ação.


Vale dizer que não houve destaques, emendas ao projeto nem emendas ao substitutivo: não houve substitutivo.(11) Prevaleceu, portanto o que fora proposto desde o início.


Não vamos entrar agora na discussão sobre a constitucionalidade do abate de aeronaves, pois já o fizemos em nossa obra citada, defendendo-a, infra, até explicaremos resumidamente. Vamos à análise de constitucionalidade dessas duas primeiras redações, mais à frente abordaremos a redação atual, objeto deste artigo.


2.2 Constitucionalidade do parágrafo único do artigo 9º do CPM com a redação da Lei 9.299/96, interpretação desta e da redação do artigo 125, § 4. da CF.


Desde o início a redação desse dispositivo, pouco feliz e pouco técnica, diga-se, causou polêmica. Mas uma redação pouco técnica não significa inconstitucionalidade. Se no Direito Militar isso ocorre constantemente e se diz que é pelo desconhecimento da matéria, que dizer de outros casos em que essa atecnia se manifesta em áreas bem mais conhecidas do Direito. Vejamos estes exemplos dados por Guilherme Rocha, versando sobre a Constituição e a Lei 12.850/2013:


E as infrações penais militares? A interpretação sistemática nos leva a compreender que se estabeleceu uma diferença entre crimes comuns, referindo-se a crimes em geral e propriamente ditos, com exceção dos eleitorais e crimes de responsabilidade que, como dissemos, a rigor não são delitos. O Supremo Tribunal Federal, seguindo esta mesma linha, há muito tem consagrado o entendimento (até hoje vigente naquela Corte) de que quando a Constituição Federal traz menção acerca das “infrações penais comuns e crimes de responsabilidade, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral”, é porque – por mais estranho e tecnicamente inadequado que pareça – quis a Lei Fundamental enquadrar as infrações penais militares entre as infrações penais comuns; ou seja, a Constituição Federal não foi técnica ao tratar das infrações penais, que para ela estão abrangidas as infrações penais comuns propriamente ditas, bem como as infrações penais militares. Quer dizer, “infrações penais comuns” – segundo a interpretação que deve ser extraída da CF/1988 quando ela faz menção a tal expressão – são todas as infrações que não constituam crimes de responsabilidade, nem infrações penais eleitorais, ou seja, as infrações penais comuns (de ação penal pública – por denúncia do Ministério Público – ou de ação penal de iniciativa privada – por queixa-crime de particular) e os crimes militares.

(...)

Sempre, portanto, que a CF/1988, quando aduzir às prerrogativas de foro, mencionar as “infrações penais comuns” ou os “crimes comuns” – ressalvando a competência da Justiça Eleitoral –, aí estarão equiparados os crimes militares. Quem gozar de prerrogativa de foro perante o STF (CF/1988, art. 102, I, b e c) ou o STJ (CF/1988, art. 105, I, a), assim, será processado e julgado nestas Cortes ainda nos crimes eleitorais e nos crimes militares.

Em pertinência à segunda expressão (“infrações penais comuns e crimes de responsabilidade”), a atecnia constitucional avulta com mais força. É que nesta expressão o que a Constituição Federal quer abranger no conceito de “infrações penais comuns” são as infrações penais comuns assim tecnicamente reconhecidas (acometidos à jurisdição comum), bem como as infrações penais militares e as eleitorais, já que, aqui, não se faz ressalva – como na outra expressão – à Justiça Eleitoral. Vale corroborar: “infrações penais comuns” – segundo a interpretação que deve ser extraída da CF/1988 quando ela faz menção a tal expressão, sem ressalvar a competência da Justiça Eleitoral – são todas as que não constituam crimes de responsabilidade.

6) Onde há exculpação não há tecnicamente crime e, portanto, o atécnico verbete “a prática de crime pelo agente infiltrado no curso da investigação” deve ser entendido como “a prática de injusto penal pelo agente infiltrado no curso da investigação”.(12)


Confirma-se, então que, em alguns dispositivos legais tem que se buscar uma interpretação que não é exatamente a literal. Em alguns, diga-se, naqueles em que soa evidente o equívoco. Além disso, existe uma grande confusão entre natureza de crime militar e competência.


Como mostrado na obra Direito Penal Militar – Teoria Crítica e Prática, tivemos inicialmente um interpretação no sentido na literalidade, revendo depois esse posicionamento com base na interpretação conforme. Em resumo, defendemos que o legislador redigiu mal, de forma atécnica, como não é raro, o parágrafo único. No entanto, o processo legislativo que destacamos mostra bem a intenção pretendida. Embora de boas intenções o jargão garanta que o inferno esteja cheio, neste caso ficou claro que, apesar da aparente contradição literal entre as normas constitucionais e o parágrafo único do art.9o do CPM (tratamos primeiro do período anterior à EC45), essa situação é bem resolvida por ser cabível o instituto da Interpretação Conforme a Constituição. De forma bem rápida: o legislador quis que os crimes dolosos contra a vida de civil deixassem de ser crimes militares. Isso fica claro no fato de ter rejeitado a fixação de competência no CPPM, como chegou a ser proposto e vimos acima. Para atingir esse objetivo ele partiu do conceito de “crimes militares definidos em lei” constante dos dispositivos constitucionais e procurou a Lei em que se define, que é o CPM. No CPM, ele foi no artigo que define as condições para ser crime militar em temo de paz: o artigo 9. Nesse dispositivo, ele fez inserir um parágrafo único que é comumente usado para fazer exceções e fez uma exceção, ainda que mal redigida. Como explicado na obra citada:


Para melhor apreciarmos a questão, precisamos, mais uma vez, recorrer à hermenêutica constitucional. Para interpretarmos a Constituição, além do já citado princípio da unidade, precisamos recorrer, também, à “interpretação conforme”. Continuemos, com base na mesma obra de Luís Roberto Barroso, que entende que a interpretação conforme compõe-se de quatro elementos distintos:


Elementos da interpretação conforme

a) escolha de uma interpretação em harmonia com a Constituição, em meio a outra ou outras possibilidades interpretativas que a norma admita;

b) a busca de um sentido possível para a norma, que não é o que mais evidentemente resulta do texto;

c) admissão de uma linha de interpretação e exclusão de outra(s) que não seria(m) incompatível(is) com a Constituição;

d) além de mecanismo de interpretação, é um mecanismo de controle de constitucionalidade porque se declara ilegítima uma determinada leitura da normal.

Na verdade, o art. 9º (lei ordinária) é que define se um crime é militar ou não. Ao dispor que é de competência do Tribunal do Júri, deixa claro que não é mais crime militar. Logo, se o sentido é o mesmo, não haveria inconstitucionalidade. O que não se pode admitir, nem Barroso admite, é que a interpretação conforme seja usada para dar um sentido que a norma não tem, apenas para considerá-la constitucional. Mas não é o caso aqui: sob esta análise, a norma seria constitucional. O problema é que a análise se complicou diante da EC 45 e com a redação da LC 97 (modificada pela Leis Complementares 117 e 136). E depois disso, a Lei 12.432, de 29.06.2011 deu nova redação ao artigo.(13)


Como disse acima, inicialmente vislumbrei inconstitucionalidade no primeiro artigo que escrevi após me graduar em Direito, na Revista de Direito da UERJ:


Em síntese, a Lei 9.299, exceto no tocante às modificações das alíneas c e f, é inconstitucional, por definir, de forma diferente, competência prevista na Constituição.(14)


Lobão(15) também entendeu nesse mesmo sentido, mas jamais reviu seu posicionamento. Afirma que houve açodamento por interesses eleitoreiros e para atender ONGs e propõe que a redação “Não se consideram militares, os crimes dolosos contra a vida, cometidos nas circunstâncias das alíneas b, c e d do inc. II” teria evitado problema em razão de a lei declarar, como permite a CF, que esses delitos deixariam de ser militares. Que isso faria com que tais delitos escapassem da competência da Justiça Militar, sem inconstitucionalidade”. No entanto, vimos que independente de motivos, a tramitação durou 4 anos, não foi tão açodada assim, e que houve várias propostas de redação rejeitadas, inclusive próximas a essa que ele propõe.


O grande doutrinador Rosseto também se posiciona pela literalidade, entendendo que o o crime continua sendo militar, da forma que foi redigido e, com isso, estaria em confronto com a Constituição (16), mas relata os posicionamentos existentes, inclusive o do STF, este no sentido de a lei redefinira os crimes dolosos contra a vida praticados por militares contra civis como crimes comuns. Relata, também que a posição do STM que declarara a inconstitucionalidade da Lei 9.299/96 no que se refere ao parágrafo único do art.9º do CPM e do art. 82 do CPPM.


O amigo e colega Cícero Coimbra, com seu coautor Streifinger, se posicionaram (17) no sentido também da literalidade, entendendo haver inconstitucionalidade por se processar e julgar crime militar na justiça comum. Cita relevante jurisprudência do STF em que este entende que a instauração de IPM não impede a instauração paralela de inquérito pela polícia civil.


Nem sempre nos alinhamos com os tribunais superiores, mas neste caso é forçoso fazê-lo, mas não exatamente pelos mesmos fundamentos alegados.


Comecemos fazendo uma importante distinção. As pessoas confundem demais a natureza de crime militar com a competência das justiças militares. Não é a mesma coisa e não é filigrana bestamente acadêmica de dândis. A questão prática é bastante afetada. Citemos trechos da nossa obra em que enfrentamos de forma detalhada essa questão. Ao explicarmos sobre a possibilidade de a justiça comum julgar civis por crimes militares praticados contra as instituições militares estaduais, isso fica claro (18):


Sobre competência da justiça comum (não militar) para processar e julgar crimes militares e aplicar o Código Penal Militar

Direito penal e processual não se confundem, por mais que certas decisões nos confundam ao misturar as duas quando tratam de crime militar. Nota-se certo modismo, na doutrina, de se exigir analisar se o sujeito ativo pode ou não ser processado e julgado pela justiça militar para configurar um crime militar: mostrando o equívoco de confundir competência (processual) com a natureza de crime militar (penal).

Por isso mesmo, ao falarmos de crimes militares, faz-se mister deixarmos claro que a mudança de competência por critérios ratione personae e ratione muneris, inclusive de índole constitucional, não implica a mudança da natureza de certas condutas que permanecem crimes militares, mesmo que seu julgamento não se dê na Justiça Militar.

Em decorrência do princípio da unidade – consagrado pela hermenêutica constitucional e do qual falaremos mais ao tratarmos do parágrafo único do art. 9º do CPM – não se admite a existência de normas constitucionais originárias inconstitucionais. Assim sendo, havendo atribuição de competência à Justiça Militar para o processo e julgamento dos crimes militares – como é o caso da Justiça Militar Federal – e prerrogativas de foro ratione muneris, elas devem ser compatibilizadas. E de que forma isso é possível? É simples: só muda a competência, direito adjetivo. A norma penal aplicável, de direito substantivo, continua a mesma. Não pode ser diferente a solução aplicável às justiças militares estaduais, a quem compete, por mandamento constitucional, processar e julgar policiais e bombeiros militares nos crimes militares, excluindo, portanto, os civis. Parece óbvio que devem eles ser julgados pela Justiça Estadual – excetuadas as prerrogativas de foro – pelos crimes militares definidos em lei. A simples redação do art. 9º, I, do CPM deixa isso claro, ao se referir a “qualquer que seja o agente”, como bem destacou o brilhante Promotor de Justiça do Distrito Federal e Territórios Nísio F. Tostes Ribeiro, em cota da denúncia dos Autos 08190.030051/01-51, referentes ao “Caso Novacap”, de grande repercussão.

“Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:

I – os crimes de que trata este Código, quando definidos de modo diverso na lei penal comum, ou nela não previstos, qualquer que seja o agente, salvo disposição especial;” (grifei)

Desenvolvendo a linha de raciocínio do colega naquele texto, para entendermos o inc. I, não havendo disposição especial que excetue a aplicação da lei penal castrense, ela deve ser aplicada pela justiça que for competente em cada caso.

Um estudo do inc. III do mesmo artigo, que define as hipóteses em que o civil pratica crime militar, nos levará à mesma conclusão, vejamos:

“III – os crimes, praticados por militar da reserva ou reformado, ou por civil, contra as instituições militares, considerando-se como tais não só os compreendidos no inc. I, como os do inc. II, nos seguintes casos:”

Se perquirirmos o significado da menção a crimes compreendidos no inc. I, como os do inc. II, constante deste inciso, descobriremos:

1.que os crimes definidos de modo diverso na lei penal comum, ou nela não previstos (referidos no inc. I), quando praticados por civil (ou militar da reserva ou reformado) serão militares quando atenderem às hipóteses previstas nas alíneas a a d do inc. III deste mesmo artigo e

2.que os crimes previstos no CPM com igual definição na lei penal comum (referidos no inc. II), quando praticados por civil (ou militar da reserva ou reformado), também serão militares quando atenderem às hipóteses previstas nas alíneas a a d do inc. III deste mesmo artigo.

Portanto, não havendo exceção legal, a lei penal militar também deve ser aplicada a estas hipóteses, a despeito de qual seja a justiça competente.

Complementando a argumentação e trazendo, novamente, conceitos formulados pelo nobilíssimo Dr. Nísio naquela mesma peça:

“O Código Penal Militar é uma lei especial, e a lei especial prevalece sobre a lei comum (Lex specialis derogat generali; semper specialia generalibus insunt; generi per speciem derogantum)

Sendo uma lei em pleno vigor, o Código Penal Militar deve ser aplicado e respeitado como qualquer outra lei deste País. A prática de conduta delituosa prevista em qualquer de seus artigos enseja a aplicação de uma sanção penal.

Por fim, observa-se que o art. 125, § 4.º, da Carta Magna é uma mera regra de competência e não uma abolitio criminis, não tendo derrogado o art. 9. do CPM”.

Não se pode deixar de aplicar a lei por não gostar dela, por não conhecê-la ou por não entendê-la. Não pode deixar, portanto, de ser aplicado o Código Penal Militar, quando há ofensa às instituições militares estaduais, apenas porque a Justiça Militar Estadual não pode julgar civis. Muda a competência, mas não muda a lei, não muda a natureza de crime militar da conduta, como, aliás, ocorre com qualquer outra justiça. Ademais, este posicionamento é reconhecido na Súmula 53 do STJ13 (de 1992, posterior à Constituição atual), isto é, aquela regra de competência afasta, indiscutivelmente, a aplicação da Lei Adjetiva Castrense, já que esta é aplicável, apenas, nos seus estritos termos (em especial, seu art. 6.º), nos processo perante as Justiças Militares estaduais.

Aliás, a Constituição atribui competência ao STF para processar e julgar os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes comuns. Em geral se entende que, neste dispositivo constitucional, crime comum é aquele que não se caracteriza como crime de responsabilidade, não excluindo, assim, os crimes militares (que, neste caso, fariam parte dos crimes comuns). Mas tal discussão não é relevante em obra que trata de direito penal, até porque o entendimento diverso – o de que, em crimes militares, os comandantes citados não seriam julgados pelo STF – também nos levaria a concluir que se trata de crime militar, só que julgado na própria Justiça Militar. A mesma Carta atribui ao STJ competência para processar e julgar desembargadores federais. Todas essas pessoas não podem, então, ser processadas por crimes militares? Parece ser óbvia a resposta negativa, caso contrário, todos aqueles que têm foro por prerrogativa de função estariam fora do alcance da Lei Penal Militar, podendo cometer condutas delituosas previstas no Código Penal Militar sem consequências penais, ferindo gravemente o princípio da igualdade.

Sem dúvida alguma, todas as pessoas que possuem prerrogativa de foro respondem por delitos previstos no Código Penal Militar perante a Justiça que for competente ratione muneris.14


Enfim, parece-nos que a prática deixa bem claro o entendimento sobre a distinção entre uma coisa e outra. Vencida essa etapa, enfrentemos, finalmente, a questão da constitucionalidade, recorrendo, preguiçosa, mas eficientemente, àquilo que já escrevemos antes sobre o assunto:


O Superior Tribunal Militar, embora modifique constantemente sua jurisprudência em diversos assuntos, vem decidindo que o parágrafo único do art. 9.º do CPM não é aplicável à Justiça Militar Federal, mas só às estaduais. De acordo com o relator, Min. Fernando Sérgio Galvão, a reforma do Judiciário, contida na EC 45, definiu competência do Tribunal do Júri quando o autor é militar e a vítima civil apenas para as justiças militares estaduais, alterando o art. 125 da CF e nada alterando no art. 124. Afirmou que o parágrafo único em comento e o art. 82 do CPPM devem receber “interpretação conforme a vontade do Poder Constituinte Reformador – EC 45 – no sentido de as regras previstas nesses artigos só se aplicam à Justiça Castrense Estadual”.90 O art. 125 da CF, sobre o assunto, dispõe:

“§ 4.º Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças”. (Grifei).

Essa é uma forma de ver a questão e a discutiremos abaixo. Vale destacar que, inclusive, a emenda foi além, tendo em vista que diferenciou funções penais do Juiz singular e dos Conselhos, no processo, ao dispor:

“§ 5.º Compete aos juízes de direito do juízo militar processar e julgar, singularmente, os crimes militares cometidos contra civis e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, cabendo ao Conselho de Justiça, sob a presidência de juiz de direito, processar e julgar os demais crimes militares”. (Grifei).

Já o STF e o STJ são e sempre foram firmes em decidir pela constitucionalidade.

O argumento principal seria que, ao dispor a lei que são de competência do Tribunal do Júri, essa lei tira a natureza de crime militar da hipótese. Mas a questão não se resolve bem assim. Esse argumento confunde competência e natureza do crime e não explica a razão pela qual uma competência definida na Constituição Federal seria preterida por uma definida na lei ordinária.

A controvérsia é grande e bem fundamentada. É necessária uma análise bastante detalhada, buscando argumentos que possam amparar um ou outro entendimento, para podermos chegar a uma conclusão razoável sobre um assunto que gera tanta polêmica.

Como vimos, tem sido considerado constitucional e aplicado o parágrafo único que foi acrescentado pela Lei 9.299/1996 ao art. 9º do CPM:

“Parágrafo único. Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos contra civil, serão da competência da justiça comum”.


No Conflito de Competência 17.665 do STJ, julgado em 27 de novembro de 1996, foi usado o seguinte argumento, que serviu de base para decisões posteriores:


“(...) quando a lei determinar que o delito deixará de ser julgado pela Justiça Militar, lógico, desqualifica-o da natureza anterior. Vale dizer, deixou de ser crime militar para ingressar na regra geral – crime comum”. (Ccomp 17.665).(19)


É importante discutir essa fundamentação, como fizemos em nossa obra:


Estaria correto esse argumento? Seguindo o mesmo raciocínio, todas as normas que definem prerrogativa de foro – a exemplo das citadas supra – excluiriam a natureza militar do crime cometido por aquelas pessoas. Significa dizer que, em muitos casos, fatos criminosos seriam tidos como atípicos – v.g. os arts. 144, 145, 146, 147, 148, 154, e 155 do CPM, dentre outros, crimes que podem ser praticados por civis. E tudo isso em razão de uma prerrogativa de foro: injustificável ofensa ao princípio da igualdade.

Para demonstrar ainda melhor o absurdo em que consistiria fundamentar tal raciocínio, basta substituirmos o termo “crime militar” pelo conceito oferecido por aquelas Cortes Superiores e teremos:

“Compete à Justiça Militar processar e julgar os crimes que devem ser julgados pela Justiça Militar”.

Tem-se, em verdade, uma pseudo definição que nada define e que é prova de um silogismo desfigurado por uma premissa falsa, transformando-o em sofisma.

Aparentemente, descartar-se-ia o principal argumento em favor da constitucionalidade do malfadado parágrafo. Vejamos outros possíveis argumentos.

Alguns entendem que a própria Constituição entrega à lei ordinária a tarefa de definir a competência da Justiça Militar. Trata-se de um entendimento baseado no parágrafo único do mesmo artigo que define a competência da Justiça Militar:

“Art. 124. À Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei.

Parágrafo único. A lei disporá sobre a organização, o funcionamento e a competência, da Justiça Militar”. (Grifei).

O Constituinte originário, evidentemente, não pretendeu definir na Carta Magna a competência da Justiça Militar e, simultaneamente (e no mesmo dispositivo), deixar tal definição a cargo do legislador ordinário. Os preceitos constitucionais não podem ser interpretados isoladamente. A Constituição é um todo, como o é o ordenamento jurídico de um Estado e, portanto, é necessária uma interpretação sistemática para uma correta exegese. Os métodos e formas para interpretar e aplicar a Constituição estão bem sintetizados e explicados na obra Interpretação e aplicação da Constituição, de Luís Roberto Barroso, que, dentre outras coisas, destaca o princípio da unidade da Constituição.(20)


E no que consiste e em que nos socorre esse princípio nesta análise?


“É precisamente por existir pluralidade de concepções que se torna imprescindível a unidade na interpretação. Afinal, a Constituição não é um conjunto de normas justapostas, mas um sistema normativo fundado em determinadas idéias que configuram um núcleo irredutível, condicionante da inteligência de qualquer de suas partes. O princípio da unidade é uma especificação da interpretação sistemática, e impõe ao intérprete o dever de harmonizar as tensões e contradições entre normas. Deverá fazê-lo guiado pela grande bússola da interpretação constitucional: os princípios fundamentais, gerais e setoriais inscritos ou decorrentes da Lei Maior”.

Assim sendo, confirma-se que nenhum conceito constitucional pode ser entendido e aplicado isoladamente. Sobre isso, na mesma obra, o magnífico autor prossegue citando doutrina e jurisprudência alemães:92

“Em julgado que Klaus Stern refere como primeira grande decisão do Tribunal Constitucional Federal, lavrou aquela corte que ‘uma disposição constitucional não pode ser considerada de forma isolada nem pode ser interpretada exclusivamente a partir de si mesma. Ela está em conexão de sentido com os demais preceitos da Constituição, a qual representa uma unidade interna’”.

Invocando tal acórdão, Konrad Hesse assinalou que a relação e interdependência existentes entre os distintos elementos da Constituição exigem que se tenha sempre em conta o conjunto em que se situa a norma. E acrescenta:93

“Todas as normas constitucionais devem ser interpretadas de tal maneira que se evitem contradições com outras normas constitucionais”. E

“(...) do ponto de vista lógico, as normas constitucionais, frutos de uma vontade unitária e geradas simultaneamente, não podem jamais estar em conflito. Portanto, ao intérprete da Constituição só resta buscar a conciliação possível entre proposições aparentemente antagônicas, cuidando, todavia, de jamais anular integralmente uma em favor da outra”. (Grifei).

No caso específico do art. 124 e seu parágrafo único, não haveria, sequer, uma efetiva contradição: a palavra “competência”, no caput referir-se-ia à ratione materiae e, no parágrafo, às demais modalidades. O princípio da unidade viria apenas reforçar esse sentido. Tendo a Constituição optado por atribuir à Justiça Militar competência para processar e julgar os crimes militares definidos em lei – admitindo, destarte, pelo próprio princípio da unidade, apenas, as exceções existentes no próprio texto constitucional (como os foros privilegiados, por exemplo) – fica a critério da lei ordinária definir os critérios de determinação de competência dos diversos órgãos da Justiça Militar – ratione loci, ratione temporis etc. – e as hipóteses de modificação de competência.

Poder-se-ia, também, afirmar que ao inserir na lei um parágrafo único dispondo que os crimes dolosos contra a vida competem ao Tribunal do Júri, o legislador pretendia dizer que aqueles casos deixavam de ser crimes militares. Recorrem ao mens legis. É sabido que existe uma diferença entre o que se quer fazer e o que se faz: a mesma distância que existe entre o sonho e a realidade. Uma coisa é um projeto de lei: a vontade de uma pessoa, ou de um grupo. Outra coisa é a lei, a vontade do todo, o consenso. Quantas são as etapas do processo legislativo? O projeto inicial não pode mudar ao longo dele para poder ser aprovado? E não pode até mesmo sofrer emendas que mudem totalmente seu sentido ou ser desvirtuado? Mais que isso: não pode, simplesmente, ter sido mal elaborado? Aliás, não pode uma lei ser inconstitucional? E quando isso acontece é porque o legislador queria? A vontade do legislador é importante, mas não afasta uma inconstitucionalidade. Como diz a sabedoria popular: “De boas intenções o inferno está cheio”


Importante aprofundar um pouco acerca da interpretação histórica:


Paulo Dourado de Gusmão, em sua obra Introdução ao estudo do direito explica a interpretação histórica:

“Para fixar o sentido real da mens legis, o intérprete tem, muitas vezes, que se recorrer do elemento histórico, verificando as razões históricas (occasio legis) determinadoras da lei. Eis a interpretação histórica, que consiste na interpretação fundada em documentos históricos do direito. Muitas vezes se serve nessa interpretação histórica dos chamados trabalhos preparatórios, isto é, dos projetos de lei, debates nas comissões técnicas das assembleias e nos plenários das mesmas, pareceres, emendas e justificações dos mesmos. Esses trabalhos não têm força vinculativa. Não são obrigatórios, pois a lei, a partir do momento em que é sancionada, torna-se independente do seu autor. Podem auxiliar o intérprete, sem dar, entretanto, a solução. Como ensina Ferrara, valem como subsídio, não como fonte autêntica da vontade da lei” (Grifei).94

Se a vontade inicial tivesse que prevalecer sempre, dificilmente haveria norma inconstitucional. A intenção inicial é, em qualquer caso, criar uma norma que não seja inconstitucional. Neste caso específico, é de sabença que a lei tinha a clara intenção de subtrair competência da Justiça Militar, para evitar que casos como os de Eldorado dos Carajás e do Carandiru fossem julgados pelas justiças militares estaduais que se afirmava serem corporativistas. Tal era a vontade, a fixação em tirar esta competência da Justiça Militar, que houve a preocupação de estabelecer a competência do Tribunal do Júri para julgamento dos crimes dolosos contra a vida cometidos por militares contra civis, nas hipóteses do art. 9.º do CPM. Tal fixação, para alguns, como Lobão,95 teria impedido que se fizesse uma norma compatível com a Constituição, uma vez que fixou uma norma de competência que contrariou, claramente, uma norma de competência de índole constitucional. No entanto, nos parece que as razões para sustentar a constitucionalidade seriam diversas e não afastadas pelos argumentos que acabamos de expor.


Analisadas tais questões, passemos a mostrar os fundamentos que nos levaram a concluir pela constitucionalidade do parágrafo único do artigo 9º do CPM:


O STJ e o STF, como visto, entendem que a norma é constitucional. A lei ordinária, aparentemente, estaria em confronto com o mandamento constitucional que estabelece a competência da Justiça Militar para processar e julgar os crimes militares definidos em lei. Porém, não podemos admitir que à lei ordinária tenha restado apenas a possibilidade de definir os critérios de determinação de competência dos diversos órgãos da Justiça Militar – ratione loci, rationetemporis etc. – e as hipóteses de modificação de competência. E por que isso não seria admissível? Porque a Constituição menciona os “crimes militares definidos em lei”. Onde estaria, então, o conceito de crime militar? Na Constituição não há, como não há o de crime propriamente militar também mencionado na Carta, como vimos acima. Ela mesma dispõe que estariam definidos em lei. No ordenamento jurídico brasileiro, a única lei em que encontramos definição é o Código Penal Militar, em seus arts. 9.º (em tempo de paz) e 10 (em tempo de guerra). Assim, o que se verifica é que a norma do art. 124 da CF (e também a do art. 125, § 4.º) é norma penal em branco. Para atingir seu sentido completo, necessita de definição contida na lei ordinária e as modificações realizadas nesta é que serão aptas a dar vigência plena àqueles dispositivos constitucionais. Quando se introduz um parágrafo nesse mesmo artigo excetuando uma determinada hipótese, como foi feito pela lei em comento, não importa a linguagem usada: aquela hipótese está sendo excluída do rol dos crimes militares. Assim sendo, a competência para conhecer da situação exposta no IPM não é da Justiça Militar. Foi modificado o artigo que tem o condão de permitir a aplicação da norma constitucional. Inconstitucionalidade haveria se o legislador ordinário dispusesse, por exemplo, que “à Justiça federal compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei”, porque estaria modificando competência de índole constitucional a órgão diverso da justiça. Só uma emenda constitucional pode atribuir os crimes militares justiça diferente da militar. O controverso parágrafo apenas restringe o rol de crimes militares, ao atuar sobre norma que define quais são as hipóteses de crime militar, em hipótese que a Constituição Federal, nitidamente, deixou para o legislador ordinário, ao optar por não dar status constitucional a tal definição.

E não é este o derradeiro argumento. Para melhor apreciarmos a questão, precisamos, mais uma vez, recorrer à hermenêutica constitucional. Para interpretarmos a Constituição, além do já citado princípio da unidade, precisamos recorrer, também, à “interpretação conforme”. Continuemos, com base na mesma obra de Luís Roberto Barroso, que entende que a interpretação conforme compõe-se de quatro elementos distintos:


São os elementos que mencionamos acima ao fazermos um resumo geral de nossos fundamentos. Detalhando, então, aquilo que falamos acima:


Na verdade, o art. 9.º (lei ordinária) é que define se um crime é militar ou não. Ao dispor que é de competência do Tribunal do Júri, deixa claro que não é mais crime militar. Logo, se o sentido é o mesmo, não haveria inconstitucionalidade. O que não se pode admitir, nem Barroso admite, é que a interpretação conforme seja usada para dar um sentido que a norma não tem, apenas para considerá-la constitucional. Mas não é o caso aqui: sob esta análise, a norma seria constitucional.


Bem lembrou, no entanto o colega Vladimir Aras em um dos primeiros artigos de complexidade sobre o assunto (21), algo que olvidáramos anteriormente quando a internet ainda não era tão eficientemente usada quanto hoje e porque o acórdão decidido em março de 2001 só foi publicado no DJ de 21 de novembro de 2003 (22). O STF chegou a decidir de forma parecida com o que escrevemos um pouco depois - redescobrimos a pólvora, ao que parece – e que foi publicado na Revista Direito Militar, da AMAJME de agosto de 2002 (antes, pois da publicação do mencionado acórdão), servindo de base para textos posteriores. Vejamos essa decisão que desconhecíamos e que corrobora o que dissemos:


Recurso extraordinário. Alegação de inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 9º do Código Penal Militar introduzido pela Lei 9.299, de 7 de agosto de 1996. Improcedência. – No artigo 9º do Código Penal Militar que define quais são os crimes que, em tempo de paz, se consideram como militares, foi inserido pela Lei 9.299, de 7 de agosto de 1996, um parágrafo único que determina que “os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos contra civil, serão da competência da justiça comum”. – Ora, tendo sido inserido esse parágrafo único em artigo do Código Penal Militar que define os crimes militares em tempo de paz, e sendo preceito de exegese (assim, CARLOS MAXIMILIANO, “Hermenêutica e Aplicação do Direito”, 9ª ed., nº 367, as. 308/309, Forense, Rio de Janeiro, 1979, invocando o apoio de WILLOUGHBY) o de que “sempre que for possível sem fazer demasiada violência às palavras, interprete-se a linguagem da lei com reservas tais que se torne constitucional a medida que ela institui, ou disciplina”, não há demasia alguma em se interpretar, não obstante sua forma imperfeita, que ele, ao declarar, em caráter de exceção, que todos os crimes de que trata o artigo 9º do Código Penal Militar, quando dolosos contra a vida praticados contra civil, são da competência da justiça comum, os teve, implicitamente, como excluídos do rol dos crimes considerados como militares por esse dispositivo penal, compatibilizando-se assim com o disposto no “caput” do artigo 124 da Constituição Federal. – Corrobora essa interpretação a circunstância de que, nessa mesma Lei 9.299/96, em seu artigo 2º, se modifica o “caput” do artigo 82 do Código de Processo Penal Militar e se acrescenta a ele um § 2º, excetuando-se do foro militar, que é especial, as pessoas a ele sujeitas quando se tratar de crime doloso contra a vida em que a vítima seja civil, e estabelecendo-se que nesses crimes “a Justiça Militar encaminhará os autos do inquérito policial militar à justiça comum”. Não é admissível que se tenha pretendido, na mesma lei, estabelecer a mesma competência em dispositivo de um Código – o Penal Militar – que não é o próprio para isso e noutro de outro Código – o de Processo Penal Militar – que para isso é o adequado. Recurso extraordinário não conhecido. (STF, Pleno, RE 260.404/MG, rel. min. Moreira Alves, j. em 22/03/2001).


Vale dizer que talvez não tenhamos, no tal artigo, redescoberto a pólvora, mas, talvez, criado uma de base dupla. O acórdão não chega a deixar nítida a diferença entre natureza de crime militar e competência da justiça militar e quase chega a afirmar que falar em competência da justiça militar e em crime militar seria algo equivalente. Mas, as passant, acabou tratando, de forma simplificada, da Interpretação Conforme, sem assim denominá-la. Nossas escusas pelo olvido, pois, mas nossa comemoração por mais uma ratificação acerca do que dissemos. Mais tarde voltaremos ao artigo do Vlad.


Mas e com o surgimento da EC 45?


O problema é que a análise se complicou diante da EC 45 e com a redação da LC 97 (modificada pela Leis Complementares 117 e 136). E depois disso, a Lei 12.432, de 29.06.2011 deu nova redação ao artigo.

Com a EC 45, o que estava na lei ordinária passou a constar da Constituição, mas com alcance diferente:

“§ 4.º Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças”. (Grifei).

Versa somente sobre as justiças militares estaduais e não faz o mesmo com a Justiça Militar da União. Aparentemente, pretendeu que o disposto só ocorresse em relação a estas justiças. O que se indaga é se o dispositivo foi constitucionalizado porque com a redação anterior era inconstitucional, ou se, diante da controvérsia havida, seria uma interpretação autêntica contida na Constituição. Nos dois casos, a interpretação decorrente do texto atual seria de que os crimes cometidos por militares estaduais contra civil nas situações previstas no art. 9.º, ou em qualquer outra seria do Tribunal do Júri. Sobre o período anterior à emenda, a discussão fica sobre constitucionalidade ou não do parágrafo único original, que já fizemos supra. O mesmo não se dá com a questão dos militares federais. Alguns entendem, a exemplo da decisão do STM, supracitado, que a EC 45 mudou todo o entendimento. Restringindo-se aos militares estaduais, não se aplicaria aos federais, reconhecendo, assim, talvez, a inconstitucionalidade anterior. Como resolver? A questão a ser resolvida, na verdade, é sobre a existência de inconstitucionalidade antes da EC 45, isto é, de 1996 a 2004.(23)


Como dito em seguida na obra, já discutimos a constitucionalidade daquela redação original e, com, isso, não entendemos que a EC 45 tenha influência na interpretação do polêmico parágrafo único no caso dos militares federais. O constituinte derivado apenas fez uma inserção para constitucionalizar o assunto tratando de competência na própria constituição. Muita coisa foi tratada de forma diferente na Justiça Militar estadual e federal, na EC 45, apenas por questões políticas e de lobby e não técnicas, tanto que se deu competência de natureza cível apenas às estaduais (e distrital) e vitaliciedade a praças estaduais. O entendimento sobre o parágrafo permanece o mesmo exposto acima, quanto a isso. Aras chega a afirmar, no mesmo artigo, que essa alteração Constitucional não teria pretendido abranger os crimes dolosos contra a vida de civis praticados por militares federais. Em todo caso, o autor já demonstrara, em trecho anterior entender pela constitucionalidade do Parágrafo único do artigo 9º do CPM, no que converge conosco. Concluímos que a Justiça Militar da União, pois, pode não ter sido atingida pela EC 45 nesse aspecto, mas já o fora pela Lei 9299/96.


Diante de tudo isso, entendemos que a redação original não era inconstitucional.


Mas ainda precisamos abordar dois relevantes aspectos:


2.3 A redação dada à LC 97 pelas LC 117 e 136.


Sobre o primeiro aspecto, chegamos a comentar que:


Em 02.09.2004 entrou em vigor a LC 117 que inseriu este parágrafo. Não havia maiores restrições a este artigo, por se tratar de sujeito ativo militar exceto que: se a Lei 9.299/1996 era constitucional (e entendemos que era), determinou que o militar que praticasse crime doloso contra a vida de civil mesmo se de acordo com a alínea c, seria submetido ao Tribunal do Júri. Assim sendo, cremos que o dispositivo inserido pela LC 117 destinava-se especificamente à hipótese do parágrafo único do art. 9.º do CPM. Com tal dispositivo, os crimes dolosos contra a vida de civil praticados por militar em serviço ou atuando em razão da função, em comissão de natureza militar, ou em formatura, ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva, ou reformado, ou civil, em situações de garantia da lei e da ordem (GLO) ou em exercícios (preparo) para este múnus, voltaram a ser de competência da Justiça Militar Federal. A revogação foi sobre parte do alcance do parágrafo e, nos demais casos, o parágrafo único prosseguia em vigor e, com o advento da EC 45 em 30.12.2004, nada mudou. Discordamos, portanto, de quem entende que a EC 45 tenha determinado mudança na interpretação do parágrafo único do art. 9.º do CPM, no que tange aos militares federais.(24)


Creio que hoje devemos aproveitar para rever essa posição. O texto original (25) e o final da LC 117 nesse aspecto era o mesmo mudando algumas palavras que não mudavam o sentido em nada: preciosismos irrelevantes. Vejamos o texto final:


§ 7. O emprego e o preparo das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem assim considerados atividade militar para fins de aplicação do art. 9º , inciso II, alínea c, do Decreto-Lei no 1.001, de 21 de outubro de 1969 – Código Penal Militar.


Para se chegar a essa lei, foram trabalhados o PLP 183, o 188 e o 281. Apenas o 188 trata desse dispositivo e não possui, ao menos aparentemente, justificativa.


A LC mexeu apenas na alínea c, do Inciso II do artigo 9º do CPM, deixando claro, apenas (não diria que ampliando), que o emprego e preparo das Forças Armadas na garantia da Lei e da ordem seriam considerados atividade militar para sua aplicação. Parece mais uma preocupação contra jurisprudências restritivas. Mas nada se fala do parágrafo e nem dos crimes dolosos contra a vida e, assim, parece-nos que deve ser interpretada abrangendo quaisquer crimes militares em vigor, mas não os dolosos contra a vida, vez que o parágrafo único permanecia fazendo a ressalva. A Lei era mais recente que a 9299/96, mas não atingia o Parágrafo único, não o revogava total nem parcialmente. E apenas diz que é considerada atividade militar: o parágrafo único torna crime comum mesmo quando a atividade é militar, como já ocorria com as atividades militares abrangidas pelas alíneas c e d na redação original destas. Em fim: atividade militar, sim, mas se a vítima for civil, o crime é comum.


No caso da Lei Complementar 136, comentamos em nossa obra que a alteração determinada por ela teria sido mais ampla e concluímos pela prevalência das alíneas c e d do inciso II sobre o parágrafo único:


Depois da alteração feita pela LC 117, alteração bem mais ampla foi feita pela LC 136, em 2010, alteração que já estudamos supra. Em lugar de restringir-se ao disposto no art. 9.º, II, c, do CPM, aplica-se a todo o art. 9.º. A nova redação do dispositivo é esta:

“§ 7.º A atuação do militar nos casos previstos nos arts. 13, 14, 15, 16-A, nos incisos IV e V do art. 17, no inciso III do art. 17-A, nos incisos VI e VII do art. 18, nas atividades de defesa civil a que se refere o art. 16 desta Lei Complementar e no inciso XIV do art. 23 da Lei 4.737, de 15 de julho de 1965 (Código Eleitoral), é considerada atividade militar para os fins do art. 124 da Constituição Federal. (Redação dada pela LC 136/2010)”.

Comentamos acima que o legislador não teria pretendido revogar qualquer dispositivo previsto no art. 9.º do CPM; ou mais, que o legislador tenha pretendido afastar a incidência do parágrafo único do art. 9.º do CPM, ao deixar claras aquelas hipóteses sem excluir as outras que estivessem de acordo com os incisos e alíneas do art. 9.º. Confirmamos, agora, tendo em vista que a lei complementar prevalece sobre a lei ordinária: nas hipóteses que dissecamos e elencamos de forma exaustiva supra (“quais seriam as hipóteses que a LC 97 expressamente declara que caracterizarão hipóteses de crimes militares, evidentemente, nos termos do art. 9.º do CPM?”), não é aplicável o disposto no parágrafo único do art. 9.º do CPM, prevalecendo o contido nas alíneas c e d do inc. II do art. 9.º do CPM.(26)


Aqui também precisamos rever nosso ponto de vista. É mais amplo que o que constava da LC 117, mas também são atingidas apenas as alíneas, deixando intacto o parágrafo único que não fora afastado, então. Mais uma vez: quaisquer crimes militares, menos os dolosos contra a vida.


Mas, como lembrado em Direito Penal Militar - teoria Crítica & Prática:


Fato é que, nos poucos dias antes do fim do mandato, e com base em argumentos semelhantes aos que rechaçamos no item 1.4 do Titulo II desta obra, o Procurador-Geral da República, Roberto Gurgel, ingressou com ADIn no STF (ADIn 5032) para obter a declaração a inconstitucionalidade do § 7.o do art. 15 da Lei Complementar n.º 97, tanto na redação que lhe foi conferida pela LC n.º 117/2004, quanto na atual, inserida pela LC n.º 136/2010. No Colégio de Procuradores de 2013 do MPM, houve curtíssimo tempo para discussão, que permitiu que, entre as sugestões dadas pelos grupos, surgisse a de ingressar na ADIn como amicus curiae.(27)


O MPM ingressou como tal. Mas o fato é que entendemos que a ADIN é equivocada.


Trataremos disso mais adiante.


Tratemos, então da Lei 12.432/2011:


2.4 Lei 12.432/2011 e ausência de mudança essencial nos crimes dolosos contra a vida de civis que não envolvem tiro de destruição


Comecemos por revisar o trecho que se baseava no que dissemos acima:


Sobre o impacto da Lei 12.432/2011 na questão, chegamos a adiantar, supra, questionamento, já que se poderia alegar que a Lei 12.432/2011, ao reeditar todo o texto da Lei 9.299/1996, acrescido do contexto de ação militar de abate de aeronave, teria devolvido a competência ao Tribunal do Júri, mas a questão seria se poderia a lei ordinária prevalecer sobre dispositivo de lei complementar, revogá-lo, ainda que parcialmente? Concluímos agora que não, pois só lei complementar poderia fazê-lo e passamos, então, à questão do abate de aeronaves.

Antes de tudo, entendemos que a LC 136 devolveu à Justiça Militar a competência para o processo e julgamento dos crimes dolosos contra a vida de civis no contexto da interceptação e abate de aeronaves (art. 303 do Código Brasileiro de Aeronáutica). Assim sendo, a Lei 12.432 foi só uma interpretação autêntica que deixou claro o que já constava da LC 136, evitando que houvesse margem para dúvida.(28)


Diante de nossa nova posição sobre o assunto, não há que se falar em mera interpretação autêntica. A Lei 12.432/2011 manteve o texto anterior, com todas as colocações que sobre ele fizemos, pois, apenas com a ressalva da situação de abate. No livro, foi defendida, ainda a Constitucionalidade da lei do abate, citaremos um trecho que basta ao nosso objeto atual:


Existe longa discussão sobre a constitucionalidade96 do abate em razão de suposto desrespeito a direitos e garantias fundamentais, inclusive a vida, que também é garantida por ela, em escala bem maior. Entendemos essenciais os direitos e garantias individuais previstos na Constituição e tratados, e defendemos a sua adequada observância. Mas, embora respeitemos aqueles que entendem que os direitos e garantias individuais são absolutos, de alcance infindável, inquestionáveis, e que, ainda, podem ser ampliados de forma ilimitada e ao sabor das necessidades do momento daqueles que praticam condutas criminosas; entendemos que os direitos e garantias fundamentais existem para garantir a liberdade e a democracia e não para ajudar a destruí-las e, portanto, dentre outras coisas, é inadmissível que um país não possa defender seu espaço aéreo e tal defesa é praticamente direito natural de qualquer país. Incompreensível admitir um país que não se pode defender. Fora a jabuticaba, raramente se vê coisa que só existe no Brasil e que seja bem sucedida. Como, no entanto, ainda não há decisões sobre inconstitucionalidade do abate de aeronaves, o entenderemos como constitucional para fins práticos.


E entenderemos assim até mesmo em razão do que disse o Dr. Ricardo Freitas em artigo há uma década:


Há estrito cumprimento do dever legal quando o agente realiza o fato típico de acordo com o disposto no direito, penal ou extrapenal. O estrito cumprimento do dever legal afasta a antijuridicidade da conduta do agente, pois haveria uma contradição lógica no atuar ao mesmo tempo lícito e ilícito em face da unidade do ordenamento jurídico global. Assim, se o piloto recebe ordem do comandante da Aeronáutica para realizar o tiro de destruição, com a observância anterior de todos os requisitos da lei e do seu regulamento, ambos estão atuando sob o pálio de uma causa de justificação. Frise-se que, muito embora venha a ser declarada posteriormente a inconstitucionalidade da Lei do Tiro de Destruição, nenhuma consequência desfavorável aos militares que a cumpriram pode advir. Nesse sentido, afirma a doutrina: ‘Cumprir um comando de norma inconstitucional, enquanto não declarada a inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, constitui efetivar o teor do dever legal, pois do contrário cair-se-ia em evidente insegurança jurídica, cada qual se arvorando em órgão de controle da constitucionalidade.(29)


Com a nova lei não existe mais parágrafo único. Passemos a tratar do §1:


2.5 O Júri que não haverá: interpretação da redação do parágrafo 1o do artigo 9o do CPM modificado pela Lei 13.491/2017


2.5.1 Uma rápida análise sobre Constitucionalidade e Convencionalidade


Embora a ADI 5032, que mencionamos acima, verse sobre dispositivos legais anteriores e não acerca da presente Lei, é importante tratar da improcedência daquela ação como fundamento para a constitucionalidade dos dispositivos inseridos pela Lei 13.491/2017: os fundamentos seriam os mesmos.


Não nos aprofundaremos demais, vez que o objeto do artigo é outro, mas é essencial resolver isso para concluir pela sua vigência.


Recentemente a própria PGR emitiu parecer (30) assinado pelo Dr. Odim Brandão Ferreira e no sentido de improcedência da ação. Cabe destacar alguns trechos:


Nem todo aumento de competência da Justiça Militar é, por si só, inconstitucional: impossibilidade da dedução da inconstitucionalidade da LC 97 pela simples verificação de que se atribuiu ao referido ramo do Judiciário maior medida de jurisdição que a prevista na lei anterior que, assim, fica acidentalmente constitucionalizada.

O problema posto pela lei resolve-se por meio da determinação das funções das Forças Armadas brasileiras, que se apura especialmente pela interpretação do art. 142 da CR: a defesa da lei e da ordem, sempre por iniciativa do poder civil competente.

A atividade desenvolvida pelas Forças Armadas nos termos do art.142 da CR c/c o art. 15, §3o , da LC 97, ou seja, quando “esgotados os instrumentos relacionados ao art. 144 da Constituição”, não é mera continuação das atividades policiais com outros meios: cuida-se aí da defesa de parcela da soberania brasileira sobre parcelas do território nacional, em contraposição a iniciativas ilícitas de estabelecimento de poder de fato paralelo e avesso ao Estado, ainda que sem o intuito imediato de substituí-lo como organização política básica da vida nacional.


Aqui se compreende não só a importância do assunto, da motivação legítima, mas fundamentos constitucionais que garantem sua vigência plena. Trata-se aqui da importância de manter a própria soberania do Brasil em partes do território, e diríamos mais que isso, de garantir a cidadania e a segurança individual de cada cidadão que ali more e/ou é afetado com isso. Sinceramente, não precisamos dar exemplos, basta abrir os jornais. Lembro da frase do colega Melgaço em entrevista no Rio de Janeiro, quando se questionava a operação de GLO no Complexo do Alemão: “Só existem duas instituições capazes de ocupar o Alemão: o Exército e o tráfico: eu prefiro que seja o Exército!”. Prossigamos:


A expressão territorial da soberania implica o aspecto positivo – apenas são legítimas as formas de exercício de poder emanadas do estado ou dotadas de sua autorização – e o negativo – o Estado não tolera o exercício de poderes paralelos, ao contrário, é o titular do monopólio da violência legítima em determinado espaço: o emprego excepcional das Forças Armadas para a garantia da lei e da ordem pública, quando esgotadas as possibilidades de sua restauração por meio dos instrumentos do sistema de justiça penal do art. 144 da CR é qualitativamente diverso da repressão cotidiana de delitos e recai no âmbito do art. 144 da CR.

A qualificação legal de delitos praticados no desenvolvimento as atividades mencionadas como crimes militares não traduz a manipulação arbitrária de conceitos constitucionais para deslocar atividade alheia às funções das Forças Armadas para a Justiça Militar; representa, antes, o normal e revogável exercício da liberdade de configuração de relações jurídicas pelo Congresso Nacional, sob o controle de validade do Supremo Tribunal Federal.


Conclui falando da similitude, por envolver a soberania, de razões com a proteção de fronteiras e caráter pacífico das eleições por requisição da Justiça Eleitoral. Ora, parece-nos que o colega foi no cerne da questão, é indiscutível que a proteção da soberania seja função própria das Forças Armadas em sua essência, na Constituição, mais, em qualquer país do mundo.


O parecerista segue questionando a argumentação, contida na ação, de que o auxílio prestado pelas Forças Armadas na segurança pública não seria atividade militar típica e que por isso não poderia estar submetida à competência da Justiça Militar sob pena de suposta violação aos artigos 5o, III e 124 da Constituição. Afirma que embora o país e o continente tenham sido “fustigados por seculares abusos dos poderes militares” isso não seria o bastante para fazer a supremacia do critério histórico sobre os normativos na interpretação da Constituição, que história e sociologia não especificam o conteúdo do direito positivo. E mais, que essas leis que atribuem competência à Justiça Militar foram votadas “em regime de plena normalidade democrática, por Congresso Nacional civil, que as pode revogar, se assim o entender, tudo sob o controle jurídico final do Supremo Tribunal Federal, igualmente civil e independente”.


Aliás, é bom que o parecerista tenha falado em civil e independente pois assim também é o Ministério Público Militar, totalmente composto de civis, com todas as garantias e prerrogativas dos demais ramos, e que é o titular do Controle Externo da Atividade Policial, quando se trata de ações militares, mesmo nesses casos especificados. E podemos dizer, por experiência própria que o MPM é um dos MP brasileiros que mais cotidianamente exerce o controle externo, possivelmente: o que mais exerce. Em todas essas recentes operações de GLO esteve atuando preventiva, concomitante e repressivamente, inclusive com membros designados especificamente para acompanhá-las em tempo real.


Trecho importantíssimo do parecer é quando o colega diz ser necessário que se verifique se as Forças Armadas podem desempenhar as funções assinaladas no art. 17, §7o da Constituição. Conclui que, se podem, o legislador pode qualificar como militares os crimes cometidos no seu desempenho. Aliás isso parece muito com uma das coisas que escrevemos em nossa obra sobre função de natureza militar:


O que seria função de natureza militar? Este seria o ponto mais polêmico e que mais restrição costuma sofrer por parte do STF. Entendemos que, a exemplo do que dissemos sobre o militar e serviço, qualquer função que possa ser legalmente desempenhada por militar e esteja sendo, nos limites da lei, seria uma função de natureza militar. A Lei 6.880/1980 define, em seu art. 23, que “Função militar é o exercício das obrigações inerentes ao cargo militar” e, em seu art. 20, que “Cargo militar é um conjunto de atribuições, deveres e responsabilidades cometidos a um militar em serviço ativo”. Já o art. 26 do mesmo diploma legal, em seu parágrafo único, dispõe:

“Parágrafo único. Aplica-se, no que couber, a encargo, incumbência, comissão, serviço ou atividade, militar ou de natureza militar, o disposto neste Capítulo para cargo militar”. (Grifei).(31)


No mesmo sentido, não é?


O parecerista prossegue destacando que esse seria o próprio sentido da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que a Justiça Militar se atenha “à proteção de interesses jurídicos especiais, vinculados às funções próprias das Forças Armadas”como diz o texto da própria ADI. Odim afirma que o parâmetro para se verificar se as ações do art. 15, §7º da LC 97 estariam entre as funções das Forças Armadas brasileiras não se encontra em pactos internacionais, nem na doutrina, mas no direito positivo. E que no caso do Brasil isso está na própria Constituição desde o período Imperial: na Constituição de 1988 está no artigo 142: defesa da Pátria, garantia dos poderes constitucionais e, por inciativa destes, da Lei e da ordem. A ADI teria minimizado esses afazeres resumindo-os a simples serviços de segurança pública. Por fim, sem nos alongarmos, o parecerista fala de novas formas de criminalidade que não seriam subjugadas pelos dispositivos normais do art 144 da Constituição o que desafia o dever básico do estado de garantir segurança aos seus cidadãos, chegam a estabelecer um poder paralelo e que a declaração da inexistente inconstitucionalidade produziria efeitos restritivos da própria liberdade individual.


Muito difícil discordar do parecerista. Apenas acrescentaria algo que ele menciona mas gostaríamos de destacar mais:


No Brasil, a Justiça Militar da União tem previsão constitucional dentro do poder judiciário, assim sendo, qualquer pessoa a ela submetida será ouvida por juiz ou tribunal competente, estabelecido anteriormente, sendo independente e imparcial como parte do Poder Judiciário e será processada pelo Ministério Público Militar, composto por membros do Ministério Público da União, todos civis, vitalícios e com ingresso mediante concurso público de provas e títulos. Aliás, já que o Pacto menciona, a Justiça Militar da União observa prazos muito mais razoáveis que outras justiças. Em todo caso, isto versa sobre competência para julgamento. Mesmo um entendimento contrário não modifica a natureza de crime militar de uma conduta, ainda que fosse julgada em outra Justiça. Mas, pela natureza da Justiça Militar brasileira e do Ministério Público Militar brasileiro, não são aplicáveis ao Brasil entendimentos como o expressado pela Alta-Comissária para os Direitos Humanos da ONU, Navi Pillay, que, ao emitir uma declaração em razão do Dia Internacional da Justiça Penal, revelou estar “profundamente preocupada” com as detenções contínuas de manifestantes no Bahrein, as perseguições a profissionais de saúde e as condenações à morte de quatro manifestantes em julgamentos militares, feitos à porta fechada:18

“‘O julgamento de civis por tribunais militares é sempre motivo de preocupação. A aplicação da pena de morte sem recurso a um processo que respeite os princípios do direito e resultante de um julgamento feito à porta fechada é ilegal e absolutamente inaceitável’, refere Navi Pillay.

A alta-comissária da ONU sublinha que ‘todos os acusados têm direito a um julgamento justo em tribunais civis, de acordo com o direito internacional e com as próprias obrigações internacionais que o Bahrein tem de cumprir no que respeita aos direitos humanos’, pode ler-se no comunicado das Nações Unidas”. (Grifei).

O processo penal brasileiro, além do que foi dito acima, faz instrução e julgamento públicos, observando as garantias individuais previstas na Constituição e em tratados. Assim sendo, não existe a violação a que ela se refere ao tratar do Bahrein. É justamente a inobservância do princípio da publicidade, de garantias e independência para juízes e promotores e de garantias individuais em alguns países que embasa certos entendimentos. Mas o Brasil não está entre eles. Desta forma, manifestações como as do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas de 200619, da Corte Europeia de Direitos Humanos sobre a Turquia20, da Corte Interamericana21 e da Comissão de Direitos do Homem e dos Povos Africanos não possuem qualquer sentido se aplicadas ao Brasil. Vale dizer, inclusive, que a Justiça Militar da União, além de observar direitos e garantias, é extremamente branda com réus civis, havendo inúmeras absolvições, quase todas com penas fixadas no mínimo legal e que, mesmo durante o regime militar, mostrou independência, com várias decisões contrárias ao governo, sendo a primeira Justiça do Brasil a conceder liminar em habeas corpus22 e, quando estes foram proibidos, as petições,23 que surtiam o mesmo efeito. E nunca devemos olvidar que as decisões do próprio STM estão sujeitas a revisão pelo STF e frequentemente são levadas àquela Suprema Corte, até porque para a defesa é um trâmite com poucas restrições, ao contrário de recursos do Ministério Público na área penal.

Quase todas as justiças militares do mundo que são tão questionadas, não fazem parte do Poder Judiciário. São na verdade estruturadas como cortes marciais. Nelas, juízes e promotores não possuem garantias constitucionais de vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos, são subordinados às autoridades que determinam o curso da investigação, as sessões não são públicas, não há liberdade de escolha de advogado etc. Fundamentações mostram, pois, ementas inaplicáveis ao Brasil.(32)


E mais: o pacto de San José da Costa Rica nada diz sobre isso: é mera interpretação de corte interamericana (33). Acho que, ao menos de forma inicial, esses argumentos bastam para afastar as preocupações sobre constitucionalidade e convencionalidade expressadas pelo amigo e colega Vladimir Aras em seu artigo (34).


2.5.2 Pequena diferença no texto do §1


Antes que se alegue, como tentou meu amigo José Osmar Coelho (35), que o texto atual do §1 difere daquele previsto no antigo parágrafo Único (nas duas versões, sem considerar a exceção do tiro de destruição), isso nenhuma influência tem em sua interpretação: pode ser colocado na conta da atecnia do legislador, que tanto comentamos supra.


Se buscarmos o processo legislativo (36), veremos que se cogitou a redação anterior, mencionando “justiça comum” e não “Tribunal do Júri”. Talvez se buscasse aproximar da redação dada ao parágrafo do art. 125 da CF. Mas, tudo isso é de pouca relevância: com uma ou outra expressão os questionamentos seriam os mesmos, os problemas seriam os mesmos, a redação longe da ideal seria a mesma e, assim, aplica-se plenamente o que dissemos acima, e ratificamos a constitucionalidade do dispositivo, pela interpretação conforme, e que faz com que os crimes dolosos contra a vida de civil, praticados por militares, deixem de ser crimes militares exceto no caso das ressalvas existentes em seguida.


Também ratificamos, como anteriormente, que jamais foi manifestada intenção de se instalar o Tribunal do Júri na Justiça militar, até porque toda a discussão girou em torno de proporcionar uma análise mais técnica dos procedimentos tomados por militares que tenham resultado em morte de civis, coisa muito rara, diga-se, para maior segurança e tranquilidade de quem atuaria nas situações elencadas. Todas as situações que foram processadas e julgadas na Justiça Militar da União desde as leis respectivas, o foram por meio do escabinado. Nas justiças militares estaduais e distrital, pelo Juízo monocrático desde a EC 45.


A práxis não é, evidentemente o melhor argumento, mas tivemos todos os anteriores acima. No bem escrito artigo que mencionamos supra, Vladimir Aras também tratou desse tema:


Para superar a objeção de ofensa ao art. 5º, XXXVIII, da CF, tem-se dito que os julgamentos de militares das Três Armas que matem civis poderiam ser realizados por um júri composto por civis presidido por um juiz-auditor militar na própria JMU. A tribuna da acusação seria ocupada por um promotor militar, isto é, por um membro do Ministério Público Militar (MPM).

Essa tese chegou a ser aventada no STM pelo ministro José Barroso Filho, no caso do Complexo da Maré no Rio de Janeiro, de 2014, quando um fuzileiro naval matou um traficante (civil). Foi estabelecida pelo STM a competência da JMU para o julgamento dessa ação penal, mas o ministro José Barroso acabou vencido no que tange a esse júri civil na JMU:

A jurisprudência do Superior Tribunal Militar, bem assim a do Supremo Tribunal Federal são no sentido de ser constitucional o julgamento dos crimes dolosos contra a vida de militar em serviço pela Justiça Castrense da União, sem a submissão destes crimes ao Tribunal do Júri, nos termos do o art. 9º, III, “d”, do CPM. Unanimidade. (STM, Pleno, rel. Min. José Coelho Ferreira, Apelação 000254-78.2013.7.01.0201/RJ, j. em 21/06/2016).

Ao que tenho conhecimento, tal tese foi pela primeira vez trazida a lume em 1990 pelo então subprocurador-Geral da República Cláudio Fonteles, em parecer apresentado ao STF no RE 122.706/RJ. Naquela ocasião, a Corte decidiu que “A Justiça Militar não comporta a inclusão, na sua estrutura, de um júri, para o fim de julgar os crimes dolosos contra a vida. C.F./67, art. 127; art. 153, par-18. C.F./88, art. 5., XXXVIII; art. 124, parag. Único. III. RE não conhecido”.


Como visto, na prática já foi aventada e rejeitada a tese. Diante de tudo que explicamos antes, cremos que faria mais sentido se questionar o júri na Justiça Militar para qualquer caso, com base no disposto no artigo 5º, XXXVIII da CF do que o fazer com base na Lei 9.299/96 e seguintes, pois estas nunca visaram a isso, como detalhadamente explicado


Acerca da soberania do júri, que tantos defendem que se aplicaria até aos crimes militares, vejamos primeiro o inciso pertinente:


XXXVIII – é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:

a) plenitude de defesa;

b) o sigilo das votações;

c) a soberania dos veredictos;

d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;


Não parece cabível em razão do Princípio da Unidade da Constituição que já mencionamos: não se admite norma constitucional originária inconstitucional. O mesmo texto original da CF que previu o júri entre os direitos e garantias fundamentais com “competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida” também previu as competências das Justiças Militares que se baseavam no escabinado e não no júri. Os dois devem ser compatibilizados sem que aquele tenha o poder de tornar este inaplicável.


Repito, tenho muita simpatia pelo conceito, sempre valorizamos o mais legítimo tribunal que existe, mas não há respaldo para essa interpretação seja na JMU, seja nas estaduais/distrital.


2.5.3 Sobre o veto


Embora não seja tema para maiores elucubrações, é importante ao menos mencionar o veto parcial dado à Lei.


Em resumo, esta Lei acabou derivando de projeto que visava a ser uma lei temporária com vigência apenas no decorre do ano de 2016, por ser o ano da Olimpíada do Rio de Janeiro, em que haveria várias operações de segurança, de GLO, a cargo das Forças Armadas.


Eis a mensagem de veto:


MENSAGEM Nº 402, DE 13 DE OUTUBRO DE 2017.

Senhor Presidente do Senado Federal,

Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1º do art. 66 da Constituição, decidi vetar parcialmente, por contrariedade ao interesse público, o Projeto de Lei no 44, de 2016 (no 5.768/16 na Câmara dos Deputados), que “Altera o Decreto-Lei no 1.001, de 21 de outubro de 1969 – Código Penal Militar”.

Ouvido, o Ministério da Defesa manifestou-se pelo veto ao seguinte dispositivo:

“Art. 2º Esta Lei terá vigência até o dia 31 de dezembro de 2016 e, ao final da vigência desta Lei, retornará a ter eficácia a legislação anterior por ela modificada.”

Razões do veto

“As hipóteses que justificam a competência da Justiça Militar da União, incluídas as estabelecidas pelo projeto sob sanção, não devem ser de caráter transitório, sob pena de comprometer a segurança jurídica. Ademais, o emprego recorrente das Forças Armadas como último recurso estatal em ações de segurança pública justifica a existência de uma norma permanente a regular a questão. Por fim, não se configura adequado estabelecer-se competência de tribunal com limitação temporal, sob pena de se poder interpretar a medida como o estabelecimento de um tribunal de exceção, vedado pelo artigo 5o, inciso XXXVII da Constituição”.

Essas, Senhor Presidente, as razões que me levaram a vetar o dispositivo acima mencionado do projeto em causa, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.


Pode-se notar um entendimento semelhante ao que expressamos acima. Resta curioso que tal dispositivo tenha permanecido no texto aprovado, vez que a data mencionada já passara, mas, embora não explicado no veto, isso é mais uma razão para que este tenha ocorrido. Certo é que muita polêmica surgiu desse caráter definitivo dado a algo que seria temporário, e mesmo quanto ao temporário já havia: parece-nos que sempre que se falar em Direito Militar teremos duas coisas, por vezes separadas, por vezes misturadas, a depender: desconhecimento e vexata quaestio.


Também houve, nessa linha, questionamentos de que o projeto teria perdido o objeto, mas como o processo legislativo é dinâmico para se adaptar às rápidas mudanças que ocorrem e nada há nos procedimentos que impeça o ocorrido, não vislumbramos razões para invalidar a Lei sob tais argumentos, também.


2.6 As exceções: o §2 inserido no artigo 9 do CPM


No que tange à nova redação, dada pela Lei 13.491/2017, é importante ressaltar que, quanto aos crimes dolosos praticados por militar contra civil só houve mudança quando se trata de militar federal.


O §2 inserido pela nova Lei passou a tratar das exceções à regra do parágrafo anterior, regra que faz com que os crimes dolosos contra a vida de civis, em geral, quando praticados por militares, deixem de ser crimes militares (continuem a não ser). Como explicamos acima, não é uma regra de competência, mas apenas uma regra de direito material redigida de forma pouco técnica. Ainda assim, desta vez se conseguiu, efetivamente, fazer aquilo que as LC 117 e 136 não foram capazes, como explicamos acima: de excepcionar a aplicação do §1º (que equivale ao antigo parágrafo único), justamente porque fez a modificação nesse parágrafo. Lembro que antes se mexia em alíneas mas ela continuava excepcionada pelo parágrafo.


Vejamos quais seriam essas exceções atuais, em que se configura, pois, a natureza de crime militar:


§ 2º Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos por militares das Forças Armadas contra civil, serão da competência da Justiça Militar da União, se praticados no contexto:

I – do cumprimento de atribuições que lhes forem estabelecidas pelo Presidente da República ou pelo Ministro de Estado da Defesa;

II – de ação que envolva a segurança de instituição militar ou de missão militar, mesmo que não beligerante; ou

III – de atividade de natureza militar, de operação de paz, de garantia da lei e da ordem ou de atribuição subsidiária, realizadas em conformidade com o disposto no art. 142 da Constituição Federal e na forma dos seguintes diplomas legais:

a) Lei no 7.565, de 19 de dezembro de 1986 – Código Brasileiro de Aeronáutica;

b) Lei Complementar no 97, de 9 de junho de 1999;

c) Decreto-Lei no 1.002, de 21 de outubro de 1969 – Código de Processo Penal Militar; e

d) Lei no 4.737, de 15 de julho de 1965 – Código Eleitoral.


Também aqui o legislador perdeu, mais uma vez a oportunidade de escrever tecnicamente. Assim, por tudo que já explicamos antes, onde se diz “serão da competência da Justiça Militar da União, se praticados no contexto”, leia-se: serão crimes militares. Não repetiremos os fundamentos pois está tudo explicado acima e aplica-se, aqui, mutatis mutandis.


Mas, apesar de se tratar de uma norma de Direito substantivo, inserida em um código de direito substantivo, no artigo que define quando os crimes tem natureza de crime militar em tempo de paz, ela tem sim reflexo direto na competência: Como às justiças militares compete “processar e julgar os crimes militares definidos em lei”(União) e “os militares dos estados nos crimes militares definidos em lei” (estados e DF), resulta que, como regra geral, esses crimes, agora militares, passem a ser processados e julgados nas justiças militares. Dizemos, como regra geral, porque já explicamos acima, com base originalmente em cota redigida pelo Dr. Nísio Tostes, crimes militares podem ser julgados na justiça comum estadual e federal, por juízos monocráticos ou Tribunais: e elencamos as hipóteses de prerrogativa de foro e crimes militares praticados por civis contra as instituições militares estaduais, vez que regra de competência não pode ser considerada abolitio criminis. Já detalhamos mais isso supra.


Essa confusão entre direito penal e processual penal terá consequências relevantes, causando polêmica quando tratarmos do conflito de normas no tempo, mais adiante, e que será uma das maiores polêmicas acerca da lei em comento.

Tratemos de cada um desses incisos. Como já antecipamos muita coisa complexa em tópicos acima, principalmente quanto a aspectos constitucionais, não haverá mais necessidade de longas explanações:


2.6.1 Inciso I: que atribuições?


Realmente o presente dispositivo parece um pouco vago, poderia permitir sua aplicação a uma infinidade de situações:


I – do cumprimento de atribuições que lhes forem estabelecidas pelo Presidente da República ou pelo Ministro de Estado da Defesa;


Ele trata, óbvio, apenas de atribuições que lhes forem estabelecidas pelo Presidente ou Ministro da defesa. Mas toda e qualquer situação? Note-se que toda a tramitação, toda a discussão foi em torno de atuações das Forças Armadas ligadas à “defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”, que é o que a Constituição elenca como destinação dessas forças.


Na verdade, tudo indica que esse inciso I apenas complementa o inciso III, visando a abranger hipóteses que poderiam dele escapar, mas que teriam relação direta com a destinação primeva das Forças Armadas, essas atuações citadas no parágrafo anterior.


Não nos parece correto entender que operações como a de Combate à Dengue e Operação Pipa, mesmo sendo importantíssimas, estariam abrangidas por essa hipótese, por não atenderem ao que dissemos, muito embora, mesmo em tais situações, possa ocorrer o que é previsto no inciso II, vez que abrange mesmo as situações não beligerantes.


2.6.2. Inciso II: que ações seriam essas?


Comecemos pelo texto:


§ 2. Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos por militares das Forças Armadas contra civil, serão da competência da Justiça Militar da União, se praticados no contexto: (Incluído pela Lei nº 13.491, de 2017)

II – de ação que envolva a segurança de instituição militar ou de missão militar, mesmo que não beligerante; ou (Incluído pela Lei nº 13.491, de 2017)


Essa não parece ser das mais difíceis.


Quando se fala em ação que envolva a segurança de instituição militar parece claro que se refere ao campo material: uma OM, uma fração desta, as instalações ou tropas, pessoas e coisas. Não se trata, aparentemente, de instituição como conceitos imaterial.


Quando trata de missão militar, significa qualquer missão legalmente dada a militares, beligerante ou não. Assim, pode ser aplicado a missões em que o confronto é provável, mas, inclusive, também a casos em que o confronto é improvável, pouco previsível (37), como aqueles que excepcionamos em exemplos no parágrafo anterior – Combate à dengue e Operação Pipa – mas apenas quando houver risco à segurança dessas missões, quando militares cumprindo missões de natureza semelhante a essas forem colocados em risco, quando estiverem sob ataque a pessoas e patrimônio sob administração militar. No que tange este último, patrimônio sob administração militar, quando refletir na segurança da própria tropa, de terceiros ou da Sociedade.


Envolve situações em que uma instituição militar


2.6.3. Inciso III: Interpretação autêntica intranorma feita pelo legislador


Leiamos, primeiro


§ 2. Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos por militares das Forças Armadas contra civil, serão da competência da Justiça Militar da União, se praticados no contexto:

....

III – de atividade de natureza militar, de operação de paz, de garantia da lei e da ordem ou de atribuição subsidiária, realizadas em conformidade com o disposto no art. 142 da Constituição Federal e na forma dos seguintes diplomas legais:


Já tratamos sobre a constitucionalidade e a natureza militar de tais hipóteses quando analisamos, acima, o parecer do Dr. Odim da ADI 5032.


Note-se que embora o inciso pareça, de início, deixar à apreciação subjetiva os conceitos de atividade de natureza militar, de operação de paz, de garantia da lei e da ordem ou de atribuição subsidiária, ele restringe esse alcance logo em seguida, ao exigir que sejam os feitos em:


1) conformidade com o artigo 142 da Constituição – que já abordamos bastante acima,


2) e na forma dos diplomas legais que a própria norma elenca: logo, restringe a aplicação deste inciso, mantém como crime militar ou torna crime militar apenas as condutas amoldadas às hipóteses a seguir:


a) Lei n. 7.565, de 19 de dezembro de 1986 – Código Brasileiro de Aeronáutica;


Nesse primeiro caso, é apenas desdobramento do parágrafo único. Com a nova redação passou a ser um inciso que já comentamos acima e que aprofundamos melhor em nossa obra que citamos.


b) Lei Complementar no 97, de 9 de junho de 1999; (Incluída pela Lei nº 13.491, de 2017)


Neste, tudo aquilo que falamos acima foi resolvido. Mexendo-se no parágrafo que faz exceção especificamente nos crimes dolosos, como sugerimos ao revermos acima o posicionamento de nosso livro sobre a influência da Lei complementar n.97 (com as mudanças da 117 e 136) sobre os crimes dolosos contra a vida praticados por militar contra civil.


Se com as mudanças anteriores (LC 117 e 136) a exceção continuava existindo pois só se modificavam as alíneas que permaneciam excepcionadas, com a presente mudança, tais crimes, quando nas hipóteses da Lei Complementar n.97, passam a ser crimes militares.


Passemos à alínea seguinte:


c) Decreto-Lei no 1.002, de 21 de outubro de 1969 – Código de Processo Penal Militar


Como discutíamos ainda ontem com nosso colega e coautor Guilherme Rocha, esta alínea pode parecer um pouco obscura à primeira vista. Mas sua interpretação é simples do que parece: no Código de Processo Penal militar, as atuações militares são na condição de Polícia Judiciária Militar.


Como dito no Manual Nacional do Controle Externo do CNPG, entre as especificidades e nuances do controle externo da atividade policial judiciária militar estão:

  1. Desconhecimento da atividade de Polícia Judiciária Militar pelos próprios operadores de Direito;

  2. Desconhecimento pelo cidadão civil ou militar das formas de questionar e denunciar ilegalidades na conduta policial e policial judiciária militar;

E a diversidade de órgãos a quem representar também causava muita dúvida, confusão, conflitos positivos e negativos de atribuição. Procedimentos e processos acabavam algumas vezes sendo processados por órgão sem atribuição do MP ou situações daquela famosa gíria esportiva “deixa que eu deixo”. Esta nova norma, além de tudo que já se disse em matéria de uma apreciação mais técnica da conduta de militares, também ajuda, por acaso, nesse aspecto. É comum afirmativa de que o júri costuma absolver militares (em geral policiais militares) bem menos que o escabinado quando o sujeito passivo é um criminoso. É certo que o júri tem legitimidade, que não precisa fundamentar e que isto se fortifica porque só se pode anular uma vez por motivo de ser manifestamente contra a prova dos autos. Não é uma crítica ao Júri, a mais importante instituição jurídica do Ocidente, mas a revelação de uma contradição: se a alegação maior contra o julgamento pelo escabinado sempre foi por suposto corporativismo e tendência a absolver crimes praticados contra criminosos, como fica esse argumento diante de tão comum constatação?


Voltando ao principal, a alínea tutela, como já deixamos claro, os crimes dolosos contra a vida, praticados por militar federal contra civil, no contexto de atuação de polícia judiciária militar, atuação bastante semelhante à de polícia judiciária em geral. Citamos como exemplos em que tais confrontos podem ocorrer, aquelas operações de polícia judiciária militar que ocorrem quando há invasões a quartéis com roubos de fuzil e munição.


Finalmente, falemos da derradeira alínea


d) Lei no 4.737, de 15 de julho de 1965 – Código Eleitoral.


Aqui cabe repetir o que dissemos ao analisarmos, acima, se a LC 97 com a redação dada pela LC 117 e depois com a LC 136 haviam alterado a competência definida pelo antigo parágrafo único. Como dissemos sobre a alínea “b” do inciso III do §2o do artigo 9 do CPPM:


Mexendo-se no parágrafo que faz exceção especificamente nos crimes dolosos, como sugerimos ao revermos acima o posicionamento de nosso livro sobre a influência da Lei complementar n.97 (com as mudanças da 117 e 136) sobre os crimes dolosos contra a vida praticados por militar contra civil.

Se com as mudanças anteriores a exceção continuava existindo pois só se moficava as alíneas que permaneciam excepcionadas, com a presente mudança tais crimes, quando nas hipóteses da Lei Complementar n.97 passam a ser crimes militares.


Aplica-se aqui. Sobre os demais aspectos, inclusive de constitucionalidade, já foram abordados acima.


Assim sendo, findamos aqui a análise especifica sobre cada mudança feita pela lei 13.491/2017 no que tange ao júri. Acrescentamos, ainda, que, que o legislador tivesse realmente criar júri na justiça militar, teria regulamentado as hipóteses de um corpo de jurados ou civil, ou militar ou um para certas hipóteses e outro para outras. Aliás, para que o corpo de jurados fosse composto de militares, nem a aplicação analógica do CPP serviria: teria que ser especificamente regulamentado.


Antes de passarmos à análise do que acontecerá quanto aos tipos penais do CPM e da legislação comum, temos que tratar de dois últimos tópicos, um agora, acerca de Lei dos Crimes hediondos e de especialidade e, na terceira parte deste artigo, acerca da nova lei no tempo.


2.7 Lei dos crimes hediondos, especialidade e um pouco mais.


Quando foi analisada, na obra Direito Penal Militar - Teoria Crítica & Prática, a chamada Lei dos Crimes Hediondos, foi demonstrado algo que não fora comentado até então: nenhum dos crimes hediondos era de competência das Justiças Militares, já que a Lei optara por elencar cada um deles dizendo apenas o número do artigo no Código Penal e não elencando nenhum do CPM, o que também ocorreu quando com o advento da Lei 8.930/94. Nenhum crime militar era considerado hediondo.


No entanto, a Lei 8.072/90 não se restringia a tratar dos crimes hediondos: tratava também daqueles que a Constituição equiparava a estes em tratamento: a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo. Destes últimos, o CPM só previa o de tráfico de drogas, embora junto com outras condutas ligadas a drogas:


Sobre a aplicação da chamada “Lei dos Crimes Hediondos” nos crimes militares


Aliás, já dissemos antes que não se pode falar em crimes hediondos militares, porque Lei dos Crimes Hediondos, Lei 8.072/1990, mencionou textualmente o número de cada artigo do Código Penal comum que seria hediondo e não se referiu aos militares. Confirmamos este entendimento. Mas o art. 2.º daquela lei se aplica, sim, aos crimes militares de tráfico de drogas. Vejamos:

“Art. 2.º Os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de:” (Grifamos).

Note-se que o legislador separa, da mesma forma que a Constituição, os crimes hediondos da:

a)prática da tortura,

b)do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e

c)do terrorismo.

Confirmemos na Constituição:

“Art. 5.º (…)

XLIII – a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;” (grifamos).

Lei e Constituição os tratam como quatro coisas independentes. Assim sendo, não define o tráfico de drogas comum como hediondo nem o faz com o militar, mas, aos dois, impõe o que se segue ao caput, uma vez que, comum ou militar, o crime é de tráfico, tanto que a rubrica marginal do art. 290 que revela seu nomen juris é: “Tráfico, posse ou uso de entorpecente ou substância de efeito similar”. Vejamos os demais dispositivos do art. 2.º da Lei 8.072/1990, aplicáveis ao Código Penal Militar:

“I – anistia, graça e indulto;

II – fiança. (Redação dada pela Lei 11.464/2007)

§ 1.º A pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime fechado. (Redação dada pela Lei 11.464/2007)

§ 2.º A progressão de regime, no caso dos condenados aos crimes previstos neste artigo, dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente. (Redação dada pela Lei 11.464/2007)

§ 3.º Em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade. (Redação dada pela Lei 11.464/2007)

§ 4.º A prisão temporária, sobre a qual dispõe a Lei 7.960, de 21 de dezembro de 1989, nos crimes previstos neste artigo, terá o prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade. (Incluído pela Lei 11.464/2007)”.

Ocorrendo uma das modalidades de tráfico do Código Penal Militar, entendemos que se aplicam os dispositivos do art. 2.º da Lei 8.072/1990, embora esses aspectos da lei tenham sido esquecidos e não sejam aplicados até hoje. (38)


Assim, entendia que configurado o crime militar de tráfico de drogas, este recebia o tratamento dado pela Lei “dos Crimes Hediondos”, justamente porque esta não se limitava aos hediondos. Até então isso, ao que parece, não fora discutido por outros doutrinadores.


E por que tal comentário é necessário agora? Ele é necessário por que vai haver uma grande discussão sobre que artigos do CPM prevalecem em vigor e quais foram revogados com a modificação da Lei. O que diz o novo texto do inciso II do artigo 9 do CPM?


Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:

II – os crimes previstos neste Código e os previstos na legislação penal, quando praticados:


Essa é a maior das alterações feitas pela Lei analisada. Ela muda muita coisa, pois antes o inciso se restringia aos “crimes previstos neste código”, exigindo a dupla condição de 1) estar previsto na parte especial do CPM e 2) estar de acordo com as condições do artigo 9 (em tempo de paz), para ser crime militar (39). Agora, crimes do Código Penal comum e da legislação extravagante podem ser considerados crimes militares em tempo de paz. Mas eis a pergunta que – oh, terrível chavão – não quer calar: como saberemos quais crimes prevalecem, quando previsto o mesmo tipo na parte especial do Código Penal Militar E na legislação comum?


Em primeiro lugar, é preciso perceber que o legislador não excluiu “Os crimes previstos neste código”: apenas acrescentou, usando a conjunção coordenativa ADITIVA “E”. Como aditiva, ela faz adições e não subtrações. Assim, apesar do que já ouvimos alguns afirmarem, devemos insistir que:

  1. Não foram revogados todos os crimes não abrangidos pelo inciso I do art. 9ªdo CPM, ou melhor,

  2. A regra geral é que permanecem em vigor os crimes do CPM quando também existirem na legislação comum.A exceção será os que já estavam revogados , óbvio, e aqueles que não prevalecerão por uma questão de especialidade.

Por que isso? Porque via de regra os tipos penais do CPM prevalecem pela especialidade, como recente e comumente vem sendo decidido. Mas, por vezes, outro elemento especializante prevalece, como aconteceu com os crimes licitatórios:


O simples fato de um tipo penal estar no Código Penal Militar não é por si só o elemento especializante que faz que qualquer crime previsto no Código Penal Militar prevaleça sobre qualquer norma comum semelhante. Já que andaram em moda as metáforas futebolísticas, podemos fazer analogia com concurso de miss ou triângulo amoroso de romance água com açúcar: a questão é discutir qual é mais especial. Precisamos analisar, caso a caso, qual Lei é mais especial naquele caso específico. Os tipos penais da Lei de licitações foram feitos para regular as hipóteses de licitação previstas na Lei 8.666/1993 e nos termos da Constituição de 1988. Os tipos dos arts. 327 e 328 do CPM são anteriores àquela Lei e à Constituição, assim, dobram-se ante o elemento especializante contido na Lei 8.666/1993, em especial, seus arts. 94 e 93, respectivamente. Os arts. 327 e 328 do CPM estão revogados.(40)


Esses já estavam revogados, mas isso ocorrerá com alguns outros, cuja especialidade só poderá gerar o confronto a partir de agora e como exemplos, teremos os crimes hediondos, inclusive os de homicídio qualificado, abrangendo, por exemplo, os de Feminicídio e contra autoridade ou agente. E por que tais crimes prevalecerão sobre os correspondentes do CPM? Porque a Constituição dispõe, entre os direitos e garantias fundamentais:


XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;


Prevê, pois, que a Lei os defina, e a Lei os definiu mas esqueceu os do CPM (41). Assim, entre os abrangidos pela Lei “dos crimes hediondos” prevalecem, por especialidade os da Lei comum, sobre os do CPM exceto quanto ao tráfico de drogas. A uma, porque, como explicamos, o tráfico não era crime hediondo, mas equiparado a estes. A duas porque já devia receber o tratamento mais gravoso dado pela Lei 8072/90 (e suas modificações) porque o artigo 290 foi abrangido por aquela lei, pelos motivos explicados acima. E mais, aliás, o mais importante sobre a especialidade, o que dissemos em nosso livro, quando tratamos de crimes contra a saúde pública e os de drogas:


É importante lembrar que o presente capítulo está inserido no Título VI que trata dos Crimes contra a incolumidade pública. Isto por si só já afastaria qualquer alegação de autolesão quando se fala em drogas: o próprio legislador deixou claro que tais crimes afetam a incolumidade pública e não só a individual. Some-se a isso que a atividade militar envolve o uso de armas, de viaturas, emergências, segurança de instalações, equipamentos e armas e, principalmente de vidas humanas o que torna os crimes de drogas especialmente perigosos à Sociedade e à administração pública em relação aos crimes comuns. Lembramos mais uma vez que Hierarquia e Disciplina não são apenas as bases constitucionais das forças armadas e das forças militares estaduais, mas vão além: são garantias constitucionais para o cidadão e a Sociedade, pois são as garantias de que as instituições armadas do Estado estarão sob o poder civil, a ele subordinado e deverão agir sempre dentro da legalidade e com respeito aos direitos fundamentais. Imaginemos o risco de um soldado armado com um Fuzil de combate automático como o FAL, de serviço, só em seu posto, que está com maconha pronta para ser consumida no bolso e a usa, ficando em estado alterado de consciência, ou que não tinha a droga e a recebe de outro que não estava de serviço. Muita coisa pode acontecer: pode acabar não reconhecendo o rondante e atirando nele, pode ficar prostrado permitindo assim que alguém subtraia sua arma para usá-la no crime, pode cair nessa mesma prostração ou no sono e deixar que vigiar sua área de atuação, permitindo a entrada de estranhos que poderão matar seus colegas e danificar, sabotar e subtrair coisas, como armas, munições e explosivos. Usando droga durante uma blitz, a depender da droga, um policial militar, poderia disparar arma contra inocentes, usar de violência em situações em que, alucinado, entende estar acontecendo outra coisa, abusar contra civis, ou, simplesmente, não cumprir adequadamente seu dever de dar segurança aos indivíduos, à Sociedade e, com isso permitir que crimes se realizem, que armas de bandidos passem, que bêbados e drogados prossigam dirigindo e matem inocentes na calçada ou em outros carros. O bombeiro que, drogado, acaba deixando de salvar pessoas ou provoca a morte do colega que atua contando que ele está em sua atuação normal. Tanta coisa… Não, definitivamente a droga no quartel, a droga usada por militar que está trabalhando, não é caso simplesmente de autolesão ou coisa semelhante: é caso de polícia, de processo e de condenação!(42)


Não nos aprofundaremos sobre outros tipos penais porque, nesta primeira parte, o foco é nos crimes dolosos contra a vida. Sobre estes últimos, então, via de regra, prevalecerão, pela especialidade, os hediondos e os que não tiverem previsão na parte especial.


Sobre a aplicação da Lei no tempo, falaremos com profundidade na segunda parte, mas já adiantamos, com base no que escrevemos acima: a mudança foi na Lei Penal. O conceito de crime militar é um assunto de direito material. Natureza de crime militar não deve ser confundida com competência. No entanto, como regra geral, ser crime militar implica ser julgado por uma justiça militar (43). Assim, acaba tendo, quase sempre, competência processual. Por tal motivo a questão da aplicação da Lei 13.491/2017, aos crimes anteriores à sua vigência, deve ser analisada de forma híbrida:

  1. Deve prevalecer, obviamente, o princípio penal de que a lei não pode retroagir para prejudicar e

  2. O princípio processual do deve ser mitigado de forma a que institutos processuais que prejudiquem o réu ou indiciado não possam prevalecer (vejam, por exemplo, que o artigo 90A da Lei 9.099 veda a aplicação desta já justiça militar, o que pode prejudicar, já que é uma norma processual que acaba tendo consequência penal).

Neste artigo, ainda não será analisada, tipo a tipo, a mudança da natureza militar para comum de certos crimes dolosos contra a vida nem quais prevaleceriam.


3. Conclusão


Seria de se estranhar que, após esse longo artigo, ainda tivéssemos a desfaçatez de fazer uma conclusão extensa. Acho que a melhor opção seria fazermos um breve resumo do que concluímos anteriormente.


Inicialmente, concluímos pela constitucionalidade da Lei 9.299/96 em sua redação original, com base na interpretação conforme.


A mudança no artigo 125 da CF feita pela EC45 jamais significou um reconhecimento da inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 9o do CPM criado pela Lei 9.200/96. Ao mesmo tempo, esse artigo faz com que a nova redação dos parágrafos, que trata dos crimes dolosos praticados por militares contra a vida de civis, não seja aplicável aos militares estaduais.


A redação dada ao parágrafo único em 2011 nada mudou quanto aos aspectos anteriores, apenas excepcionou as hipóteses previstas no que costuma ser chamado de “Lei do Abate”.


Nenhuma dessas normas é eivada de inconstitucionalidade ou viola convenções.


Nenhuma das modificações feitas até hoje visou a estabelecer o júri nas justiças militares. A análise dos processos legislativos, a motivação que as gerou, o próprio teor e a ausência de regulamentação sobre como se daria tal júri são, dentre outros, grandes evidências que afastam tal interpretação: simpática, diga-se. Poderia, sim, ser criado júri com jurados civis e com jurados militares, a depender do caso julgado, para substituir o escabinado – e não só em crimes dolosos contra a vida – mas isso nunca ocorreu.


Os crimes dolosos contra a vida, praticados por militar contra civil serão, em regra (mas uma regra bastante excepcionada pelas condições do §2o), crimes comuns (é norma de direito material e não de competência, apesar da redação ainda infeliz). Mas serão militares nas condições da Lei do abate (como já constava da redação de 2011), da Lei complementar n.97 que versa sobre operações de garantia da lei e da ordem e outras hipóteses e atuação das Forças Armadas, no exercício da polícia judiciária militar e quando no contexto do código eleitoral.


Os crimes hediondos terão a hediondez como elemento especializante, pois a constituição prevê que devem ser definidos e o foram com esquecimento do CPM, e prevalecerão sobre os tipos originais equivalentes do CPM, inclusive quantos os crimes dolosos contra a vida e abrangendo hipóteses como feminicídio e crimes contra autoridades de segurança. Ressalte-se, aqui, que tráfico não é crime hediondo, é equiparado a estes, e, por não ter sido listado naquelas leis com a citação do artigo do CP e pela índole do Código Penal Militar, avessa a uma lei permissiva como a 11.343 pelo risco que esta traria para a segurança, dever, serviço, hierarquia e disciplina. Por tal motivo, prevalece o 290, que merece, sim , um ajuste, mas não a lei genérica de drogas.


Por fim, last but not least, o essencial para uma futura análise de tipos penais: deve prevalecer o princípio penal de que a lei não pode retroagir para prejudicar e é necessária mitigação do princípio processual tempus regit actum, para institutos processuais que prejudiquem o réu ou indiciado penalmente não possam prevalecer.



Notas


1. Que, infelizmente, retratava a realidade da tragédia do desmoronamento do viaduto da Paulo de Frontin no Rio.


2. Ouro de Tolo, De Raul Seixas.


3. O Voto do Ministro Joaquim Barbosa foi feito fato a fato, “fatiado” como seu dizia, como estavam descritas as condutas na denúncia e é mais lógico, em vez que se fazer pessoa a pessoa com todas as condutas de cada. Gerou uma polêmica totalmente desnecessária: era óbvio que tratar de um fato por vez, como em qualquer relato de história linear, era o mais adequado


4. ALVES-MARREIROS, Adriano. FREITAS, Ricardo. ROCHA, Guilherme. Direito Penal Militar - Teoria Crítica e Prática. Método, 05/2015. VitalBook file.


5. PINTO, José Osmar Coelho Pereira. Crime doloso contra vida de civil e o tribunal do júri na Justiça Militar do Estado. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XX, n. 156, jan 2017. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php/site/livros_gratis/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=18420>. Acesso em out 2017.


6. ROCHA, Fernando A.N. Galvão da. Tribunal do Júri na Justiça Militar Estadual. In: www.jusmilitaris.com.br. Disponível em: http://jusmilitaris.com.br/sistema/arquivos/doutrinas/juri.pdf. Acesso em out 2017.


7. § 3º A lei estadual poderá criar, mediante proposta do Tribunal de Justiça, a Justiça Militar estadual, constituída, em primeiro grau, pelos juízes de direito e pelos Conselhos de Justiça e, em segundo grau, pelo próprio Tribunal de Justiça, ou por Tribunal de Justiça Militar nos Estados em que o efetivo militar seja superior a vinte mil integrantes.


8. Processo legislativo foi pesquisado em <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1140090&filename=Dossie+-PL+2801/1992+CPIECR> acesso em maio de 2017


9. Como mostrado na obra Direito Penal Militar-Teoria Crítica & Prática: ao contrário do voluntarismo demonstrado em várias decisões que pretendem se substituir à Lei.


10. Disponível em http://www2.camara.leg.br/legin/fed/emecon/2004/emendaconstitucional-45-8-dezembro-2004-535274-exposicaodemotivos-149264-pl.html . Acesso em outubro de 2017


11. Consta da ficha de tramitação disponível em <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=464191> acesso em outubro de 2017


12. ALVES-MARREIROS, Adriano. FREITAS, Ricardo. ROCHA, Guilherme. Direito Penal Militar - Teoria Crítica e Prática. Método, 05/2015. VitalBook file. Trechos do Título II e III.


13. ALVES-MARREIROS, Adriano. FREITAS, Ricardo. ROCHA, Guilherme. Direito Penal Militar - Teoria Crítica e Prática. Método, 05/2015. VitalBook file.


14. MARREIROS, Adriano Alves. Lei 9.299: militares no tribunal do júri? Revista da Faculdade de Direito da UERJ, Rio de Janeiro, n. 6 e 7, 1999, p. 363-367.


15. LOBÃO, Célio. Direito Penal Militar. Brasília: Brasília Jurídica, 1999


16. ROSSETO, Ênio Luiz. Código Penal Militar Comentado. Editora Revista dos Tribunais. 1a Edição 2012. São Paulo.p.128 e 129.


17. COIMBRA, Cícero. STREIFINGER, Marcelo. Manual de Direito Penal Militar. 2a Edição. 2012. Editora Saraiva


18. ALVES-MARREIROS, Adriano. Direito Penal Militar - Teoria Crítica e Prática. Método, 05/2015. VitalBook file.


19. Obra citada


20. Obra citada


21. ARAS, Vladimir. As novas competências da Justiça Militar após a Lei 13.491/2017. Disponível em https://vladimiraras.blog/2017/10/18/as-novas-competencias-da-justica-militar-apos-a-lei-13-4912017/ Acesso em outubro de 2017.


22. Inteiro teor do acórdão disponível em http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=258778 Acesso em outubro de 2017


23. ALVES-MARREIROS, Adriano. FREITAS, Ricardo. ROCHA, Guilherme. Direito Penal Militar - Teoria Crítica e Prática. Método, 05/2015. VitalBook file.


24. Obra citada


25. § 7o O emprego e o preparo das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem é considerado atividade militar para fins de aplicacão do art. 9º, II, alínea c, do Código Penal Militar.” (NR)


26. Obra citada


27. Obra citada


28. Obra citada


29. BRITO, Ricardo de. Aspectos jurídicos das forças armadas na interceptação e no abate de aeronaves: a Lei do Tiro de Destruição. Revista do Ministério Público Militar, n. 20, 2007


30. Parecer da PGR pela improcedência da ADI 5032. Subprocurador-Geral da República Dr, Odim Brandão Ferreira


31. ALVES-MARREIROS, Adriano. FREITAS, Ricardo. ROCHA, Guilherme. Direito Penal Militar - Teoria Crítica e Prática. Método, 05/2015. VitalBook file.


32. ALVES-MARREIROS, Adriano. FREITAS, Ricardo. ROCHA, Guilherme. Direito Penal Militar - Teoria Crítica e Prática. Método, 05/2015. VitalBook file.


33. O próprio STF já decidiu e ratificou que as decisões da corte interamericana não possuem poder cogente. Até porque isso violaria a própria soberania que é cláusula pétrea e, por isso, ninguém tem mandado para dela dispor, apesar de ideologias globalistas.


34. ARAS, Vladimir. As novas competências da Justiça Militart após a Lei 13.491/2017. Disponível em https://vladimiraras.blog/2017/10/18/as-novas-competencias-da-justica-militar-apos-a-lei-13-4912017/ Acesso em outubro de 2017.


35. Advogado e Presidente do Instituto baiano de Direito Militar, do qual sou vice.


36. Aqui por exemplo: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=9A7F431BCA2C5AB0706B4434758584E1.proposicoesWebExterno2?codteor=1474872&filename=PL+5768/2016


37. Se bem que em áreas de alto risco como várias que existem no Rio de Janeiro, acaba sempre sendo previsível que algum ataque possa acontecer, principalmente por parte do crime organizado.


38. ALVES-MARREIROS, Adriano. FREITAS, Ricardo. ROCHA, Guilherme. Direito Penal Militar - Teoria Crítica e Prática. Método, 05/2015. VitalBook file.


39. Em tempo de Guerra, o art. 10, IV considerava os crimes da legislação penal comum como militares, naquelas condições explicitadas.


40. ALVES-MARREIROS, Adriano. FREITAS, Ricardo. ROCHA, Guilherme. Direito Penal Militar - Teoria Crítica e Prática. Método, 05/2015. VitalBook file.


41. Os decretos anuais de indulto, curiosamente, ao tratarem dos crimes hediondos e equiparados, também excepcionam os previstos no Código Penal Militar e correspondentes aos mencionados


42. ALVES-MARREIROS, Adriano. FREITAS, Ricardo. ROCHA, Guilherme. Direito Penal Militar - Teoria Crítica e Prática. Método, 05/2015. VitalBook file


43. Explicamos acima que nem sempre: a justiça comum pode processar e julgar crimes militares em certas hipóteses.

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