por vezes disfarçado de política criminal e proporcionalidade, ou:
O FALSO “princípio” da proporcionalidade
Cuidado com os falsos profetas que vêm até vós vestidos como ovelhas, mas, interiormente, são lobos devoradores...
Mateus 7:15
Falei, noutro dia, do falso “princípio” do não retrocesso, sempre usado para justificar o mais regressista ativismo ideológico. Hoje volto a fdalar de outro falso “princípio”: o da proporcionalidade, sempre usado no Brasil, e até na Alemanha, como veremos, para parecer justificar a decisão ou parecer como o autor quiser que seja, ao arrepio da Lei e da Constituição.
Este artigo é bastante parecido com o que publiquei no saudoso Tribuna Diária, do Sileno, em 2021; mas, apesar disso, está cada vez mais atual diante dos horrores que fazem alegando desproporcionalidade...
Sobre "Política criminal"
Vez por outra vemos aqueles casos em que se pretende fazer "política criminal" no âmbito do judiciário. Sobre isso, já falamos quando tratamos em nossa obra Direito Penal Militar- Teoria Crítica & Prática, sobre uma decisão que negava aplicação a dispositivo em vigor do CPM, tipificado plenamente, aplicando outro que resultava em pena fosse mais baixa:
Atuamos no processo 36/01-6 da Auditoria da 7ª CJM e transcrevemos trecho de nossas razões de apelação, abaixo, que nos mostra mais dois exemplos de casos semelhantes e mais alguns subsídios.
Condenação por tentativa de furto qualificado, a despeito de o réu ter aproveitado a sua qualidade de militar.
Segundo explicou a Juíza-auditora em seu voto na sessão de julgamento, o STM vem deixando de aplicar a pena de peculato- culposo, mesmo quando este se tipifica, para aplicar a de furto, já que a pena seria exagerada. Seria, prima facie o que se poderia denominar de razões de política criminal. Difícil aceitar que a Justiça possa ser titular do Poder Legislativo - a quem cabe fazer e modificar leis - revogando norma que não é inconstitucional, negando-lhe aplicação.
Na Apelação (FO) 2002.01.049231-3-PE, o STM manteve a condenação do réu (omissis) por furto qualificado, também em situação em que o réu se aproveitara de sua condição de militar e de chefe de seção para a subtração. Manteve a sentença de primeiro grau por seus próprios e jurídicos fundamentos. A sentença de primeiro grau também não explicava claramente o porquê de o peculato-furto ser inaplicável ao caso. Não verifiquei, portanto, até agora, a razão de o artigo 303, §2º do CPM ter perdido a vigência, não tendo, portanto, mudado de opinião sobre a sua aplicabilidade. Vale ressaltar que, sobre esse assunto, ao menos dois Ministros parecem ter entendimento semelhante: os Ministros VALDÉSIO GUILHERME DE FIGUEIREDO (Relator) e MAX HOERTEL, que votaram pela condenação pelo artigo 303, §2° do CPM.
Abastecer viaturas fazia parte das atribuições do réu. O acesso às viaturas estacionadas também estava ligado à sua condição, não há como negar que a subtração foi cometida valendo-se da facilidade que lhe proporcionava a sua condição de militar.
Nem se fale, também, em política criminal. Melhor do que eu poderia fazer, o Ministro Alte Esq JOSÉ JÚLIO PEDROSA explicou em voto divergente na Apelação 2000.01.048466- 3/PE.:
Em termos bem simples, as políticas públicas definem objetivos e traçam as linhas gerais de ação para os diversos setores da Administração Pública.
A política criminal não foge à regra. Ela estabelece as metas e orienta os procedimentos pelos quais o corpo social organiza as respostas as fenômeno criminal. (...)
"Política Criminal" não é uma expressão mágica, um "abracadabra" que permite ao Juiz sobrepor-se à lei e decidir contra-legem.
A sentença, curiosamente, alega que "uma condenação por incursão no artigo 303, §2º do mesmo código, como pretendido pelo Dr. Promotor, implicará em resposta penal totalmente desproporcional ao ato praticado". Este fundamento soa tão mágico quanto o "abracadabra" mencionado pelo Ministro. É uma decisão contra- legem e, como Fiscal da Lei devo refutar.[1]
Notem o que pontuou o Ministro Pedrosa, sabiamente. Na prática, pode-se dizer que ele se abstém de USURPAR o poder legislativo e, dignamente, lembra que o juiz não pode decidir contra-legem, não deve se colocar acima da lei.
Aliás, na mesma obra eu destaquei a atitude de alguns renomados Ministros do STF da década de 30 do século passado que colocavam a Lei acima de sua opinião de como ela deveria ser:
o Ministro Carlos Maximiliano fez ressalvas à letra m do artigo 88 do antigo Código da Justiça Militar, mas no conflito de jurisprudência n. 1307[2], de 1941 declarou dignamente:
Sempre tive favorável à competência da justiça comum, mas, diante do texto da lei, tenho de julgar competente a justiça militar. [3]
O Ministro Carvalho de Mourão se expressou de forma semelhante, consagrando o primado da Lei sobre a vontade do intérprete:
Em casos análogos, sempre votei em sentido contrario, isto é, considerando competente a justiça civil. Agora, porém, diante do Código da Justiça Militar que contém dispositivos expressos sobre o caso, modificou o meu voto. [4]
O fato é que, cada vez mais, as políticas públicas, que são assunto para aqueles que o povo elegeu, muitas delas fracassadas nas urnas e na prática[5], são perpetuadas ou determinadas por quem não é avaliado de 4 em 4 anos, colocando em perigo a essência da democracia.
Assim, não pode o julgador passar por cima da lei por entender ser mais justo que ela, se ela está em vigor. Isso é o famigerado ativismo judicial do qual passaremos a falar agora.
Ativismo Judicial como usurpação do poder que emana do Povo
Pense naquele julgador que aplica um instituto inexistente na Lei e na Constituição só para beneficiar o réu... Pensou? Lembrou de vários, não é?
Esse instituto seja qual ele for, apesar de ter ares legais, usando um belo nome fofinho, ainda assim é mero ativismo judicial, mesmo que baseado em jurisprudência praticamente isolada. Por isso, não é mais que usurpação do poder legislativo e que conduz à Juristocracia, termo usado por Han Hirschl[6].
Acerca da mencionada obra "Rumo à Juristocracia" [7], de Han Hirschl, Grilo lembrou sensata e democraticamente no seu prefácio do livro:
Durante a leitura desta obra, é impossível não raciocinar a respeito das consequências nefastas do ativismo judicial, costumeiramente praticado de bom grado pelos judiciários espalhados pelo mundo, sob os aplausos dos demais poderes voluntariamente amputados. O livro acaba por jogar luzes no ainda tímido conceito de autocontenção judicial, postura adequada aos membros do judiciário, mas que é inacreditavelmente desconhecida de muitos julgadores. Como o peixe que vive dentro da água, enxergam apenas o oceano de doutrinação ativista que a hegemonia acadêmica lhes inoculou as ideias, sendo certo que muitos juízes simplesmente desconhecem o conceito de autocontenção ou nunca sequer pensaram no assunto sob essa ótica.
Aliás, mais à frente, no mesmo prefácio, Grilo faz uma crítica pertinente a vários ideólogos do ativismo judicial. Dessas críticas, destacamos esta:
Pound indaga se haveria alguma vantagem na ministração da justiça pelos corpos legislativos ("tribunais legislativos"). Ele conclui negativamente, dizendo que "a psicologia desses tribunais [legislativos] é por demais e amiúde a da multidão ou da populaça". Ainda no mesmo parágrafo, Pound ratifica seu desprezo pela efetivação da vontade do povo expressada pelo legislativo, deixando escapulir sua rejeição aos anseios populares, considerando que os tribunais administrativos e os tribunais legislativos não têm preparo para a tomada de decisões fundamentais, colocando toda a credibilidade na casta judicial esclarecida (os tribunais judiciários) .
Enfim, ela expõe as entranhas do pensamento do ativismo: sua essência antidemocrática, seu desprezo pelo poder que emana do povo e que é exercido em seu nome e apenas com sua permissão. E que acaba influenciando, até mesmo, juízos que mesmo não tendo esse desprezo, não se apercebem das graves consequências de perpetuarem e propagarem esse ativismo.
Por fim, devemos lembrar aquilo que nossos pais disseram a cada um de nós, tenho certeza que eles tiveram isso em comum: se o Joãozinho se atirar da ponte, você vai se atirar também?
Não é porque outros julgadores já fizeram isso, não é por que há uma ou outra jurisprudência nesse sentido que devemos nos atirar da ponte do direito, matando a Democracia que há em cada um de nós. Cada passo a mais rumo ao ativismo judicial e à juristocracia vai resultar em mais interpretações inventadas que vão destruir o Direito criando progressivas condições para acabar com sua efetividade e deslocando a janela de Overton até um ponto em que se negue totalmente a aplicação da lei, substituindo-a pela vontade de pretensos iluminados... Não sabe o que é janela de Overton? E quer vir lacrar pra cima de mim me mandando estudar? Háháháháhá. Vai estudar!!!
"Proporcionalidade" usada como mero ativismo judicial.
Aliás, o que se vê no Brasil é um uso curioso da tal proporcionalidade. Aliás, não só no Brasil, como veremos adiante. Os autores costumam falar em 3 supostos elementos: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.
São supostos, porque o que se lê, ao ver isso aplicado, é sempre jogo de palavras em que um elemento se confunde com os outros na pretensa argumentação para, ao final, se concluir fundamentando a proporcionalidade em sentido estrito com variações sobre o mesmo tema que invariavelmente significam apenas: "eu acho que não é proporcional, então não é".
Junto com expressões como "política criminal" e "princípio" do não retrocesso", são apenas malabarismos linguísticos para passar por cima da lei sem que esta seja inconstitucional, aliás, por vezes até pra passar por cima da própria constituição.
No sistema inglês, não se fala em proporcionalidade, mas de razoabilidade. Sendo um sistema baseado no júri como principal instituição, e por isso mesmo mais democrático que qualquer outro, a razoabilidade é determinada pelo common sense. Common sense não é bom senso: é SENSO COMUM. Sim, esse mesmo, tão vezes desprezado com expressões de nojo por certos juristas pátrios, havendo até os que acham ser democrático é ser sempre contra a maioria, ser contramajoritário. Aliás, talvez seja esse o motivo de tanto horror que o Júri, o mais justo dos tribunais, lhes causa.
Exemplificando a confusão de que falei entre os termos, vejamos este artigo de Costa :
O primeiro subprincípio estabelece a exigência da conformidade ou adequação entre meios e fins, segundo a qual o ato deve ser apropriado para a realização das finalidades a ele subjacentes. Como exemplo para ilustrar esse elemento, podemos citar o célebre Caso das Farmácias, julgado pelo Tribunal Constitucional Federal em 1958[1]. Tratava-se de uma lei da Bavária que restringia o número de farmácias em uma comunidade, condicionando a concessão de licenças para a abertura de novas farmácias à demonstração de que elas seriam comercialmente viáveis e que não causariam problemas econômicos para os competidores da região.
(. . . )
Então, nesses casos, as limitações impostas sobre a liberdade de escolha são necessárias para salvaguardar o público contra certos riscos e perigos. Tais limitações são razoáveis porque os candidatos para as várias profissões sabem com antecedência se eles têm ou não as qualificações necessárias. O princípio da proporcionalidade aplica-se a esses casos; qualquer exigência estabelecida precisa ter uma relação razoável com o fim perseguido [p.e., a prática segura e ordenada de uma profissão].
[1] COSTA, Alexandre Araújo. < https://arcos.org.br/o-controle-da-razoabilidade-no-direito-comparado/ > Acesso em 1º de outubro de 2024.
Note-se que que a tão festejada corte alemã, para falar de adequação argumenta necessidade e razoabilidade...
E deixa isso ainda mais evidente, um pouco adiante:
Então, nesses casos, as limitações impostas sobre a liberdade de escolha são necessárias para salvaguardar o público contra certos riscos e perigos. Tais limitações são razoáveis porque os candidatos para as várias profissões sabem com antecedência se eles têm ou não as qualificações necessárias. O princípio da proporcionalidade aplica-se a esses casos; qualquer exigência estabelecida precisa ter uma relação razoável com o fim perseguido [p.e., a prática segura e ordenada de uma profissão].
Adequado para o Tribunal Constitucional alemão é o razoável? É o necessário? É isso? O autor do artigo comenta a decisão, dizendo:
Percebe-se, dessa forma, que a lei que restringia a possibilidade de estabelecimento de novas farmácias foi considerada inconstitucional porque a restrição que ela impunha no direito fundamental da livre iniciativa não era adequada à garantia do interesse público ligado ao caso - a defesa da saúde pública.
Então eu devo dizer sobre (a decisão analisada e) a conclusão de Costa: lendo com perspicácia, significa dizer que adequado é sempre aquilo que o julgador achar adequado... Isso é muito preocupante pois permite não aplicar a lei, sempre que não se quiser aplicar...
Passando a explicar necessidade, o autor cita outra decisão alemã:
Como exemplo da sua aplicação podemos citar o Caso dos Confeitos de Chocolate [3] [Chocolate Candy Case], no qual se discute a constitucionalidade da lei que proibiu a fabricação de doces que podiam ser confundidos com confeitos chocolate. O objetivo da lei era evitar que os consumidores se enganassem pela aparência ou pela embalagem e comprassem um produto diverso do que eles desejavam.
"Leis como a envolvida aqui são elaboradas para proteger o consumidor de confusão quando da compra de comida e de ameaças à sua saúde. [...] A seção 14 (2) da Lei dos Produtos de Chocolate foi criada para proteger o consumidor de decepções. Essa proteção foi constituída, sem dúvida, no interesse público e justifica a restrição de práticas de comércio.
Para realizar esse objetivo, o legislativo não apenas exigiu um rótulo adequado, mas proibiu a venda do produto. Proibir, no entanto, é um dos mais drásticos meios imagináveis para proteger o consumidor de confusões e práticas comerciais enganadoras. O regulador pode prevenir essas ameaças ao interesse público de forma eficaz e eficiente pela simples exigência de um rótulo adequado.
No caso em exame, não há justificativa aceitável para impor uma restrição mais ampla do que seria necessário para proteger o consumidor de falsos rótulos. Então, a regulação deveria tomar apenas as medidas necessárias para a proteção do consumidor. Para alcançar esse fim, seria suficiente exigir uma rotulagem adequada."[5]
Percebam que para falar de NECESSIDADE, o tribunal alemão fundamentou com adequação porque só em dois parágrafos disse 3 vezes que algo deveria ser adequado, comprovando a confusão de conceitos e o mero jogo de palavras.
E agora, vamos à tal proporcionalidade em sentido estrito, ainda usando o mesmo artigo e as decisões alemães que ele traz:
O terceiro subprincípio é o da justa medida ou da proporcionalidade em sentido estrito. Como exemplo da utilização jurisprudencial desse critério, podemos citar o Caso Lebach [1]. Lebach participou de um assalto a um quartel das forças armadas alemãs, no qual vários dos soldados que estavam de guarda foram mortos ou feridos. Por esse crime, ele foi condenado a 6 anos de prisão, em um julgamento que atraiu bastante a opinião pública. Alguns anos depois, às vésperas da sua liberação, uma rede de televisão planejou gravar um documentário baseado no crime.
(. . . )
No entanto, o interesse em receber informações não é absoluto. A importância central do direito de personalidade exige não apenas a proteção da íntima e inviolável esfera pessoal [do acusado], mas também uma estrita observância do princípio da proporcionalidade. A invasão da esfera pessoal é limitada pela necessidade de satisfazer adequadamente o interesse público de receber informações, enquanto o mal infligido ao acusado deve ser proporcional à gravidade da ofensa ou à sua importância para o público. Conseqüentemente, não é sempre permitido revelar o nome, publicar uma foto ou usar algum meio de identificar o autor [da ofensa]. [...]
De qualquer forma, um programa de televisão sobre um grave crime que não é mais justificado pelo interesse do público em receber informação sobre eventos correntes pode não ser retransmitido se ele coloca em perigo a reabilitação social do criminoso. O interesse vital do criminoso a ser reintegrado à sociedade e o interesse da comunidade em reconduzi-lo a sua posição social original devem geralmente ter precedência frente ao interesse público em uma discussão posterior sobre o crime."[2]
Observem que, nesse caso, os julgadores concluem que o interesse público não é mais justificado. Dizem que a matéria pode prejudicar sua ressocialização. Além de contrariar, com certeza, o que a maioria das pessoas pensa, afirma ser desproporcional que as pessoas saibam de um crime grave, quem o cometeu, como aconteceu, seus motivos.
SIGNIFICA QUE OS JULGADORES SE DERAM O DIREITO DE APAGAR A HISTÓRIA, O REGISTRO HISTÓRICO. Isso lembra o Ministério da verdade da Obra de Orwell que, ultimamente, tem sido muito atual...
Em seguida ele dá mais um exemplo de como o tribunal substituiu opções legislativas não inconstitucionais, sobre Conselho de Universidade, pelo que eles achavam que era melhor alegando, como explica o autor sobre as regras que o próprio tribunal criou que: "todas essas regras estão implícitas na simples garantia da liberdade de ensino e pesquisa. Embora tenha admitido que o modo tradicional de gestão universitária não era a única forma legítima de organização, o Tribunal terminou por concluir, na prática, que a Lei Fundamental impede uma ruptura desse modelo tradicional."
Enfim, eles decidem como acham que é melhor ou mais justo, cavando inconstitucionalidades onde elas não existem.
Não podemos corroborar com desrespeito à democracia, com usurpação do poder legislativo, com a deslegitimação do poder que emana do povo e em seu nome é exercido e criar nova lei para cada caso em que eu achar que preciso.
Citando o Grande Juiz Scalia da Suprema Corte americana, Wanzeller explica em artigo publicado na obra "Guerra à polícia. Reflexões sobre a ADPF 635:
Os originalistas acreditam que as disposições da Constituição têm um significado fixo, que não muda (exceto por emenda constitucional): as regras significam hoje o que significavam quando foram adotadas, nada mais, nada menos. Isso não quer dizer, é claro, que não haja novas aplicações de antigas normas constitucionais. O Tribunal deve determinar, por exemplo, como o A garantia da Primeira Emenda de "liberdade de expressão" se aplica a novas tecnologias que não existiam quando a garantia foi criada - para caminhões de som, por exemplo, ou para televisão licenciada pelo governo.
Nesses novos campos, o Tribunal deve seguir a trajetória da Primeira Emenda, por assim dizer, para determinar o que ela exige - e certamente que esse empreendimento não está totalmente fechado e seco, mas requer o exercício de julgamento. Mas reconhecer a necessidade de projeção de velhos princípios constitucionais sobre novas realidades físicas está muito longe de dizer o que dizem os não-originalistas: que a Constituição muda; que o próprio ato que uma vez proibiu agora permite, e o que uma vez permitiu agora proíbe."
Parece óbvio. Tão óbvio quanto a cor da grama observada por G. K. Chesterton. Mas em poucas palavras, diria que o originalismo nada mais é do que uma técnica interpretativa segundo a qual o juiz, diante de um caso concreto, adota e respeita os termos da lei, sem que sua aplicação represente qualquer espécie de inovação capaz de tangenciar não só o texto legal como os princípios que lhe deram origem. É o oposto do contorcionismo retórico usado pelo intérprete progressista para justificar a imposição de sua própria vontade (caprichosa ou não) em detrimento da vontade do povo, manifesta através dos representantes eleitos para o exercício regular da legislatura. É o antagonismo da flexibilização estrutural da norma, em especial no que tange às competências dos poderes constituídos, não raras vezes ultrapassadas e exercidas de forma irregular.
O originalismo não recebe o capricho do julgador. Recebe, sim, a vontade fundamentada do constituinte originário, historicamente declarada e formalmente consignada nos motivos relevantes para constituição da ordem jurídica, a qual representa a escolha de um povo, num determinado ciclo de sua história.
A lei tem que ser respeitada. A Constituição também. Assim sendo, e já encerrando este longo artigo sobre ativismo judicial, voluntarismo e outros males, e demonstrando a que serve, em geral a pretensa proporcionalidade, o pedido que faço SEM QUALQUER ESPERANÇA DE SER ATENDIDO, é um só: o respeito à lei, à Constituição, ao Poder legislativo e a submissão de todos nós ao PODER QUE EMANA DO POVO.
NOTAS
[1] ALVES-MARREIROS, Adriano. FREITAS, Ricardo. ROCHA, Guilherme. Direito Penal Militar- Teoria Crítica & Prática. 1a Edição, Editora Método. São Paulo, 2015.
[2] TEIXEIRA, Sílvio Martins. Código Penal Militar Explicado. 1946.
[3] Apud in TEIXEIRA, Sílvio Martins. Código Penal Militar Explicado. 1946.
[4] Apud in TEIXEIRA, Sílvio Martins. Código Penal Militar Explicado. 1946.
[5] Alves Marreiros, Adriano (organizador) Guerra à Polícia: Reflexões sobre a ADPF 635/Adriano Alves-Marreiros - organizador. 1ª ed. - Londrina: Editora E.D.A. - Educação, Direito e Alta Cultura, 2021.
[6] Rumo À juristocracia - As origens e consequências do novo constitucionalismo/Ran Hirschl; Tradução Amauri Feres Saad -1ª ed.- Londrina, PR. Editora E.D.A. - Educação, Direito e Alta Cultura, 2020.
[7] Rumo À juristocracia - As origens e consequências do novo constitucionalismo/Ran Hirschl; Tradução Amauri Feres Saad -1ª ed.- Londrina, PR. Editora E.D.A. - Educação, Direito e Alta Cultura, 2020.
Adriano Alves-Marreiros é Promotor de Justiça Militar e mestre em Direito.
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