1. Generalidades
Por mais despóticas e aterrorizantes que fossem as forças de Frederico II, déspota esclarecido e soberano prussiano em seu escopo de ampliar as cercanias de seu palácio afim que pudesse se deleitar dos diálogos que tinha como interlocutor seu amigo Voltaire, a certeza daquele humilde moleiro fazia jus ao nome de seu moinho, Sans Souci, no idos do século XVIII quando respondeu àquele monarca sob a ameaça de tomar-lhe o que seria seu meio de sustento e berço de sua tranquilidade e serenidade: “O Senhor! Tomar-me o moinho? Só se não houvesse juízes em Berlim”[1].
A inabalável tranquilidade daquele camponês, perpetuando-se às gerações vindouras em face do corolário de toda sociedade civilizada, democrática e regida por um Estado Democrático de Direito que é a inflexibilidade, inviolabilidade, rigidez, ponderada, tranquila e derradeiramente justa de seus magistrados, ante quaisquer vicissitudes que se descortinem diante de qualquer um do povo, impera a certeza da solidez e inflexibilidade do juiz ante seus valores, princípios e sobretudo os ditames da Lei.
Quando discorre sobre a justiça platônica, Hans Kelsen[2], em sua obra O que é Justiça?, o faz apontando justamente o embate entre Sócrates e Glauco quando este nega a grandeza da Justiça, enquanto o mestre a conceitua e fundamenta como bem em si própria, identificando-a inclusive e primordialmente como retributiva, meritocrata, como a própria fórmula da igualdade ente os homens, “A cada um, o que lhe cabe.”
2. Desenvolvimento
Em seu legado, José Frederico Marques[3] ensina que a militar é das poucas jurisdições especiais cuja existência se justifica. Não se trata de um privilégio de pessoas, mas de organização decorrente, como lembra Astolpho Rezende, das “condições especiais que ligam pessoas e atos de índole particular atinentes ao organismo militar, como também pela natureza das infrações disciplinares, aptas a comprometer a ordem jurídica e a coesão dos corpos militares. Como diz um notável escritor italiano, trata-se de juízes especiais, técnicos, juízes naturais do soldado, que sabem pesar os danos que à disciplina e ao serviço, ao bom estado militar podem custar as infrações e que a este dano proporcionam a adequada sanção.”(...) não é um privilégio pessoal, nem prerrogativa de corporações ou seita, mas é ordenada sobre a essência do serviço militar, a qual não admite que a disciplina fique perturbada ou enfraquecida, que sejam subtraídas aos chefes militares a vigilância sobre as ordens, a subordinação e o juízo das violações delas.”4
A Carta Democrática da República de 1988, dentre suas cláusulas em seu consagrado art. 5º, LIV, herdado do art. 39 da Magna Carta de 1215 após embates ferrenhos na Inglaterra do século XIII contra o autoritarismo do rei João Sem Terra, em sua cláusula 39 dispôs: “Nullus liber homo capiatur, vel imprisonetur, aut disseisiatur, aut utlagetur, aut exuletur, aut aliquo modo destruatur, nec supere um mittemus, nisi per legale judicium parium suorum vel per legem terre.”[4], nenhum homem livre será capturado, levado prisioneiro, privado de seus bens, exilado ou de qualquer modo destruído e nunca usaremos de força contra ele, nunca mandaremos que outros o façam, salvo em processo legal por seus pares ou de acordo com as leis da terra.”.
Nesse diapasão, a CF/88 em seu aludido inciso LIV explicita que ninguém será preso ou privado de seus bens sem que antes seja submetido ao devido processo legal, como também em seu inciso XXXVII não haverá juízo ou tribunal de exceção, robustecido pelo inciso LIII, garantindo que ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente.
Seguindo a esteira constitucional em seu capítulo III, sessão VII, dedicado ao Poder Judiciário Castrense, em seu art. 122, inciso II, estabelece como um dos órgãos jurisdicionais militares os Juízes Militares instituídos por lei, e define a competência da Justiça Militar, para processar e julgar os crimes militares definidos em lei (art. 124), no âmbito da Justiça Militar da União (JMU).
No âmbito da Justiça Militar Estadual (JME), a CF prevê como órgãos de primeiro grau, os Conselhos de Justiça, e confere a competência de processamento e julgamento dos crimes militares definidos em lei, bem como ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri (art.125, § 4º, CF), exigência essa já estabelecida na Carta a João Sem Terra, no supra citado dispositivo legal , qual se refere ao “julgamento pelos pares”, bem como, como órgãos de segundo grau, estabelece aos Tribunais Militares a competência em decidir sobre a perda de Posto e Patente dos Oficiais e graduação dos Praças de sua respectiva Força.
Neste corolário constitucional, o art. 93, inc. IX reza que todos órgãos do Poder Judiciário terão “...fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade...”, sem que faça acepção de instância, especialidade ou ainda natureza ou origem desse decidum, sendo pacíficas as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) neste sentido:
“(...) 2. Não há hierarquia entre as provas, podendo o magistrado valorá-las segundo seu livre convencimento, de forma motivada, como se tem na espécie vertente. Sistema do livre convencimento motivado. (...)” (STF – 2ªT. – HC 116.153/MS – Rel. Min. Cármem Lúcia – J.21.05.13)
3. O dever de motivação do voto do juiz militar
A decisão do Escabinato é formada por cinco veredictos soberanos, devendo cada membro fundamentá-lo de forma idônea, transparente, contextualizando à realidade dos autos no tocante à confrontação das provas do processo, nos termos da denúncia do Parquet, dono da ação penal, sob pena de nulidade, pois inclusive e sobretudo haverá comprometimento do contraditório e da ampla defesa, uma vez que deixará o acusado, réu ou ainda o condenado de conhecer os elementos de convicção, bem como a marcha racional percorrida pelo magistrado, quer este togado ou fardado, à formação de seu juízo de convicção da qual decorre sua decisão, comprometendo sobremaneira possíveis atos processuais em sede de recurso em todas suas espécies e instâncias.
Vencida nossa marcha constitucional, invocando novamente Hans Kelsen em sua pirâmide da hierarquia das normas, remetamo-nos por ora à legislação infraconstitucional, especificamente ao que nos aponta como definição dos crimes militares em seus arts. 9º e 10 do CPM. Depois valemo-nos do Código de Processo Penal Militar (CPPM), diploma este que instrumentaliza aquele diploma de direito material, em seu art. 297, sobretudo acerca da avaliação das provas, das disposições gerais dos atos probatórios em seu título XV, capítulo I:
Art. 297. O juiz formará convicção pela livre apreciação das provas colhidas em juízo. Na consideração de cada prova, o juiz deverá confrontá-la com as demais, verificando se entre elas há compatibilidade e concordâncias.
Eis o ponto. No referido dispositivo processual, de forma expressa e literal, o Juiz Presidente do Conselho de Justiça, convidará os Juízes a votar, nos termos do art. 435 do CPPM, convite este no sentido de oferecer-lhes a palavra, nos termos em que são conduzidos os trabalhos do pleno, envolto do decoro e da liturgia necessárias, primeiro o juiz auditor e depois os Juízes Militares a se pronunciarem sobre questões preliminares e o mérito da causa, sendo em nenhum momento há quaisquer nuances que possam ensejar interpretação diversa a esta que explicitamos, em contra manus ao que determina a CF/88, conforme já apresentamos em seus arts. 93, IX; 122, I; 124 e 125, sedimentando o amalgama desse entendimento, são os Tribunais Superiores pacíficos em seus precedentes jurisprudenciais, inclusive quanto ao vício insanável e a inconstitucionalidade do ato judicial que padece de fundamentação, sobretudo dos membros dos Conselhos de Justiça:
“Na Justiça Militar a fundamentação contida na sentença não é apenas o voto solitário do Juiz-Auditor, responsável por redigi-la, mas a expressão do pensamento de todos os membros do Conselho de Justiça.”(STM – Apelação nº0000008-97.2008.7.10.0010 – Rel. Min. William de Oliveira Barros – J. 05.02.10), e “ainda que o Juiz-Auditor tenha divergido dos Juízes Militares, compete ao magistrado togado a redação da sentença, restando ressalvado e preservado o livre convencimento motivado de cada um dos membros do Conselho de Julgador quando da tomada de votos, preservando assim o comando constitucional esculpido no inciso IX do Art. 93 da constituição Federal.”(STM – Apelação nº0000007-70.2011.7.08.0008 – Rel. Min. Cleonilson Nicácio Silva – J. 25.03.13).
Importante observar, inclusive para que nos sirva de esteio, a marcha cronológica de tais decisões no sentido da sedimentação dos precedentes jurisprudenciais.
Em momento algum quaisquer interferências increpadas pelo juiz auditor ou omissão dos juízes militares poderá ocorrer no sentido de reduzirem a atuação dos juízes fardados a mera declaração de voto, quase que equiparando-os aos jurados do Conselho de Sentença do Tribunal do Júri, como prevê o CPP em seu livro II, título I, capítulo II, onde de forma extensa e pormenorizada descreve o funcionamento do constitucional tribunal do júri que, de chofre tem por motivos que o próprio legislador, até pela exclusão que reputamos ao espírito da lei, em seu art. 437, incisos VII e VIII, as autoridades, servidores de polícia, de segurança pública e sobretudo os militares de uma possível composição do referido júri, em face das experiências, competências e habilidade e conhecimento que fogem do homem médio, como preconiza o aludido dispositivo.
Nessa esteira, impossível não aportarmos nas primorosas colocações do doutrinador do Direito Castrense, Dr. Ronaldo João Roth[5], Juiz de Direito, Titular da 1ªAuditoria Militar da Justiça Militar Estadual Bandeirante, em sua precisa obra Justiça Militar e as peculiaridades do Juiz Militar na atuação jurisdicional, quando bifurca o dilema ora guerreado em duas partes, acerca da obrigatoriedade e sobretudo o dever da fundamentação do voto do juiz militar, ao invés de se reduzir, resumir, limitar e porque não falar em se restringir em apenas decidir quanto à condenação e ou absolvição do réu. E o mesmo doutrinador registra[6] que
“como a decisão do colegiado é formada, então, da decisão proferida pelo voto dos juízes individualmente, de tal sorte que o cômputo daqueles é que formará a decisão do colegiado. Entendo, assim, que cada um dos votos do Colegiado deve obedecer ao mandamento constitucional da motivação para ser válido. E esse raciocínio encontra razão também pelo fato de os votos dos juízes, sejam convergentes ou divergentes, poderem ocorrer por fundamentos diversos, daí a motivação explicita do juiz permitirá às partes o exame de sua pertinência e razoabilidade.”
No diapasão que nos leciona cotidianamente o eminente doutrinador, e fazendo nossa alusão ao que discutimos anteriormente acerca das origens da Justiça e do devido processo legal, bem como sua recepção pela Constituição Nacional, para que o juiz militar, ou ainda como define de forma épica o eminente Coronel da Polícia Militar do Estado de São Paulo, Jairo Paes de Lira[7], inclusive com incomensurável experiência de caserna e com suas atuações como Juiz Militar em diversos Conselhos Permanente e Especiais de Justiça, o Juiz Fardado, em seu primoroso artigo homônimo ao termo ora grifado, onde o mesmo discorre sobre a importância da atuação efetiva do juiz fardado nos atos processuais e sobretudo na declinação de seu voto, fundamentado, lecionando que:
“Nunca será demasiado insistir num ponto fundamental: o Juiz Fardado, face aos atributos antes esmiuçados, não pode contentar-se em proferir voto de mera aquiescência em relação ao voto do Juiz-Auditor. Seu voto deve ser motivado, exatamente como sempre será o do Juiz Togado, ainda que concordante com este em mérito (portanto em tipo de decisão) e em pena, quando condenatório for. Assim sendo, no momento crucial de julgar, quintessência do dever de jurisdição, o Juiz Militar deverá observar a prerrogativa do livre convencimento” (art. 437, 438, 439 e 440 do CPPM).
No mesmo diapasão, Abelardo Júlio da Rocha[8] chama a atenção, em sua lição, que a função de Juiz Militar na Justiça Militar não se confunde com a do jurado no Tribunal do Júri, vez que enquanto este último só julga questões de fato, e, por isso manifesta-se de maneira monossilábica, diferentemente “não é assim que julga o juiz fardado. Ao pronunciar-se acerca do fato sub judice deve o juiz militar incursionar nas questões de direito que circundam o ilícito penal militar, tanto para condenar quanto para absolver.”, atendendo-se aos comandos do CPPM (art. 437 e 440) e com a diretriz do seu compromisso público de julgar de acordo com a lei e a prova dos autos (art. 400).
Assim, a atuação do Juiz Militar que tem o dever de motivar seu voto não pode se reduzir a atuação do jurado, valendo aqui a lição de Jorge Cesar de Assis[9] " como juiz militar, o oficial não deverá permanecer inerte, em posição de sentido – mesmo sentado. Também não deve se manifestar monossilabicamente. Naquele momento é juiz, questiona, analisa, tira dúvidas, decide."
Defendendo, também, o dever de motivação do voto por parte do Juiz Militar, leciona Enio Luiz Rossetto[10] que:
“A motivação da decisão, que é indispensável sob pena de nulidade, é realizada em dois momentos distintos. Oralmente na votação do Conselho; depois pelo auditor ao redigir a sentença e facultado, ainda, ao membro do Conselho justificar o seu voto, se vencido.
Na motivação da decisão, com ensina Antônio Magalhães Gomes Filho, é necessário “que o juiz explique não somente o conteúdo das provas em que se baseou, mas igualmente o raciocínio de que se valeu para, através dos dados probatórios incorporados ao processo, chegar à decisão final”.
Coroando o dever de motivação do voto, por parte do Juiz Militar, José Álvaro Machado Marques leciona[11]: “Aos jurados, portanto, basta a íntima convicção. Aos membros dos Conselhos de Justiça Militar, é exigida a explicitação do motivo de sua decisão que deve estar ancorada na lei e na prova dos autos.”
Em face das peculiaridades, especificidades, dos princípios e valores ensinados desde os primeiros bancos escolares castrenses, porque não nos remetermos às legiões romanas que outrora já enxergaram tais primícias, de quem o mundo contemporâneo herdou as até romantizadas Cortes Marciais, sempre sob os auspícios legais, cada qual em seu contexto, e por fim o culto à correção de atitude a primazia na prática da cidadania e civismo em sua mais ampla acepção, sempre alicerçados pela Disciplina e Hierarquia, a lente pela qual enxergará o juiz fardado, com essa experiência acerca dos meandros e minúcias da vida militar, quer seja aquartelado, quer seja em operação ou ainda em atividade ostensiva de polícia administrativa que, muito embora precipuamente civil, encontra no militarismo e seu regime o porto seguro à sua excelência e tranquilidade que transmite a sociedade pela certeza da prevalência soberana e intangível dos valores já elencados à defesa da pátria e da sociedade.
Nesse sentido, eminente ex-Ministro do STF José Carlos Moreira Alves[12] :
“Sempre haverá uma Justiça Militar, pois o juiz singular, por mais competente que seja, não pode conhecer das idiossincrasias da carreira das armas, não estando pois em condições de ponderar a influência de determinados ilícitos na Hierarquia e Disciplina das Forças Armadas.”
Através da minuciosa análise da conduta perpetrada pelo réu, suas nuances pessoais, colocando-se na pessoa do acusado, dada a presunção de inocência que impera também na corte marcial, como beneplácito da dúvida pro reu, mas também enxergando de forma real e cristalina seus pares, superiores e subordinados e sobretudo o cidadão civil, razão de nossa existência, por que juramos lealdade, fidelidade no cumprimento das leis e das normas mesmo que para com isso paguemos com a própria vida em defesa de um anônimo desconhecido, estudo das provas, aplicando a lei em abstrato ao caso concreto, sobrepujado por esse amalgama da experiência castrense, seus princípios, valores e sua especialidade, que efetivamente se alcança a tão almejada justiça desde os ideais platônicos.
E tudo isso não poderá se resumir ao o singelo sim ou um perplexo não, como faz o jurado. Não teria o mesmo militar, exposto a todas as exigências, infortúnios, benefício e prerrogativas que recaem sobre si no exercício do sacerdócio das Armas, tal qual seus julgadores, direito de conhecer a esteira pela qual marchou até a proclamação da tão almejada absolvição ou ainda condenação, se a Constituição Federal assim exige?
4. Da dosimetria na prolação da pena do juiz militar
Não requereria menor esforço e primor ao apreendermos que desta prévia cominação legal da referida pena decorre o dever do juiz militar na prolação da dosimetria sobre seu decreto condenatório, fundamentando de forma técnica, profissional, e sobretudo jurídico-legal sua decisão, o quantum da vingança pública que deverá recair sobre os ombro daquele que afrontou o Contrato Social em sua ultima ratio, em seu diploma penal, in casu, o Militar, devendo o juiz fardado, de posse de todos as informações legalmente obtidas e processadas, munido desse arcabouço que lhe é peculiar pela própria condição de Militar, de Oficial das Armas, debruçar-se tecnicamente sobre os dispositivos legais concernentes à dosimetria da pena, como já defendia no parágrafo XXIII em sua obra prima, Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria, em Dos Delitos e Das Penas, enquanto àquele tempo já se preocupava com a proporcionalidade.
É cediço reforçar o mister de marcharmos sob o mesmo percurso racional trilhado anteriormente ao encontro do livre convencimento motivado, sob o mesmo crivo constitucional do já esmiuçado Art. 93, IX CF/88, sob o mesmo risco o desmoronamento do voto do Juiz Fardado em sua dosimetria ante sua inconstitucionalidade e potencial lesão ao Contraditório e Ampla Defesa.
Ora, observando o sistema trifásico do cálculo da pena, em seu art. 69 e subsequentes do CPM, encontramos especificamente os instrumentos que sobretudo o juiz fardado possuirá em face de sua bagagem pessoal, experiência profissional intimo conhecimento da vida de caserna e seus nuances quanto a Disciplina e Hierarquia, debruçado sob as circunstâncias judiciais, apreciando a gravidade do crime e a personalidade do réu em julgamento, onde deverá buscar reconhecer na conduta concreta guerreada as circunstâncias judicias existentes, a saber: intensidade do dolo ou grau da culpa, a maior ou menos extensão do dano ou perigo de dano, os meios empregados, o modo de execução, os motivos determinantes, as circunstâncias de tempo e lugar, os antecedentes do réu, sua atitude de insensibilidade, indiferença ou arrependimento após o cometimento do crime.
No mesmo sentido, em sede de 2ª fase da dosimetria à luz do arts. 70 e 72, não seria diferente, ainda que de forma mais objetiva, em face da indumentária do juiz fardado a cominação deste dispositivo e seus subsequentes, tudo sob a mesma ótica. Já na 3ª fase, fará incidir, se existentes, as causas de aumento e de diminuição de pena, conforme bem sustenta Ronaldo João Roth.[13]
5. Conclusão
A marcha à motivação do voto do Juiz Fardado, como corolário à legitimidade, moralidade, legalidade e sobretudo a constitucionalidade de seus atos processuais, no exercício de sua judicatura a partir do recebimento da denúncia pelo Juiz de Direito, trilhada constitucionalmente, permitindo ao réu o devido processo legal (art. 5º, inc. LIV da CF), sob os princípios da Disciplina e Hierarquia (art. 42 e 142 da CF), através do Juiz Natural (art. 5º, LIII da CF) corroborado à previsão como pertencentes aos órgãos do Poder Judiciário (art. 92, inc. VI da CF), definida competência para tal (art. 122, inc. II cc. 124 da CF), sobretudo fundamentados todos seus atos (art. 93, inc. IX da CF).
Dessa forma, oportunamente assim que convidado pelo Juiz-Auditor para fazê-lo (art. 435 do CPPM), permitirá o exaurimento do Espírito da Lei que almejou o cidadão através de seu legislador, quando através do devido processo legislativo, submeteu o militar, quer este das Forças Armadas, quer das Forças Militares Estaduais ao crivo de seus iguais, Homens das Armas, respeitados os Princípios Hierárquicos, o Poder-Dever de julgar os crimes pelos quais são processados, justamente pelas idiossincrasias da caserna e a carreira das Armas o tem, sendo o Juiz Militar, fardado, sine qua non, ao encontro do cabedal técnico-jurídico do Juiz de Direito que relatoria o julgamento no escabinato castrense.
Assim, deve o Juiz Militar dizer as razões de seu voto nos julgamentos do Conselho de Justiça como dever constitucional e legal, matéria essa que encontra eco na doutrina especializada e na jurisprudência, pois o Juiz Fardado não é jurado e, nessa condição, vota justificando o voto, oral e publicamente, característica esta que marca a Justiça Castrense, alcançando o mais justo e perfeito deslinde do processo-crime, nos mais altos ditames da Lei e da Justiça pela qual tanto clama a escorreita Sociedade.
Eduardo Casagrandi Mansoldo Filho é Capitão QOPM da Polícia Militar do Estado de São Paulo, Bacharel em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública e em Direito, Oficial R/2 do Exército Brasileiro e Especialista em Política e Estratégia pela ADESG/SP.
Artigo publicado na Revista Direito Militar – XXI – NÚMERO 129 – MAIO / JUNHO DE 2018
NOTAS
[1] Andrieux, François: “Si nous n’avions pas des juges à Berlin.” Le Meunier de Sans-Souci. Paris: éd. Nepveu, 1818. vol. III, p.208.
[2] Kelsen, Hans. O que é Justiça?. São Paulo: Martins Fontes, 2001. p.100.
[3] Marques, José Frederico. Da Competência em Materia Penal. Campinas: Ed. Milleniun, 1ª edição atualizada. Atualizadores: Nalini, José Renato e Dip, Ricardo Henry Marques, 2000. p. 165 e 166.
[4] Magna Charta Libertatum. Disponível em www.policiamilitar.sp.gov.br/unidades/dpcdh/Normas/DireitosHumanos/MagnaCarta
[5] ROTH, Justiça Militar e as peculiaridades do Juiz Militar na atuação jurisdicional. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003, p. 97
[6] ROTH, Ronaldo João. O Juiz Militar e o dever de motivar sua decisão, inserto no livro “Temas de Direito Militar”. São Paulo: Suprema Cultura, 2004, p. 26.
[7] LIRA, Jairo Paes de. O Juiz Fardado nos Conselhos da Justiça Militar Estadual, inserto no livro “Direito Penal Militar e Processual Penal Militar”, Coordenado por Edgard Moreira da Silva. São Paulo: ESMP, Caderno Jurídico, v 6, nº 3, 2004, p.70. Disponível: http://www.tjmsp.jus.br/escola/ead.html
[8] ROCHA, Abelardo Júlio da. O Juiz Militar nos Conselhos de Justiça e no Tribunal de Justiça Militar de São Paulo, inserto no livro Justiça Militar Estadual – Aspectos Práticos, Coordenado por Sylvia Helena Ono, Curitiba: Juruá, 2017, pp. 114/115.
[9]ASSIS, Jorge César de. Os Conselhos de Justiça Militar, Florianópolis: Revista Direito Militar, AMAJME, ano IV, n.° 20,nov/dez., 1999, p. 29.
[10] ROSSETTO, Enio Luiz. Do processo e julgamento na Justiça Militar em primeiro grau: uma abordagem crítica, inserto no livro “Direito Penal Militar e Processual Penal Militar”, Coordenado por Edgard Moreira da Silva. São Paulo: ESMP, Caderno Jurídico, v 6, nº 3, 2004, p. 36. Disponível: http://www.tjmsp.jus.br/escola/ead.html
[11] MARQUES, José Álvaro Machado. Dos Conselhos de Justiça e dos Conselhos de Sentença, inserto no livro “Direito Penal Militar e Processual Penal Militar”, Coordenado por Edgard Moreira da Silva. São Paulo: ESMP, Caderno Jurídico, v 6, nº 3, 2004, p. 95. Disponível: http://www.tjmsp.jus.br/escola/ead.html
[12] BAPTISTA, Carlos de Almeida. A Justiça Militar da União, pelo seu novo Presidente-Entrevista. Florianópolis: Revista “Direito Militar”, AMAJME, nº 13, 1998, set./out., p. 3/6.
[13] O cálculo da pena no Processo Penal Militar. Florianópolis: Revista Direito Militar, AMAJME, n° 67, set./out., 2007, pp. 10/14.